Coordenação estratégica entre governos federal e estaduais é essencial para obter resultados expressivos e rápidos no combate ao desmatamento.

Novo ano, novos governos e, com eles, expectativa renovada de que as autoridades protejam
a Floresta Amazônica. Promessas fazem parte de campanhas políticas e discursos
desempenham um papel importante de sinalização. Mas, agora no poder, o dever dos
governos eleitos é transformar promessas e discursos em ação. E rápido.

Em um contexto de recursos financeiros e de pessoal sabidamente insuficientes para
simultaneamente atacar todas as frentes de desmatamento, é necessário adotar uma
estratégia de priorização. As prioridades escolhidas dependerão, claro, dos objetivos das
autoridades. Em se tratando de zerar o desmatamento, parece razoável usar sua ocorrência
para definir essas estratégias.

Esse é o intuito do nosso novo estudo: ajudar o poder público a priorizar. Para isso, não basta
saber onde o desmatamento ocorreu. É preciso também identificar quais esferas do poder
público são responsáveis por combatê-lo nos diferentes territórios. Isso é insumo crítico tanto
para o planejamento estratégico das autoridades, quanto para cobrar os responsáveis. Nesse
sentido, vale destacar alguns resultados da pesquisa.

Não haverá desmatamento zero sem atuação efetiva do governo federal. Quase metade da
área desmatada ao longo da última década no bioma Amazônia estava em áreas públicas
federais. A categoria fundiária que mais chama atenção nesse cenário são os assentamentos
rurais. Apesar de só ocuparem 7% do bioma, durante o período de análise responderam por
25% do desmatamento na região e 54% da perda florestal em áreas federais. Dada a função
social dos assentamentos, esforços de proteção ambiental nesses territórios devem ser
acompanhados de medidas para promover o desenvolvimento socioeconômico dos
assentados.

Quase metade da área desmatada ao longo da última década no bioma Amazônia estava em áreas públicas federais. A categoria fundiária que mais chama atenção nesse cenário são os assentamentos rurais.'

Clarissa Gandour e João Mourão, do Climate Policy Initiative/PUC-Rio

As florestas públicas não destinadas também merecem destaque. Elas concentraram 32% do
desmatamento em áreas federais e apresentaram expressiva aceleração da perda florestal a
partir de 2019. Além de destinar essas florestas para fins de conservação e uso sustentável, é
preciso lidar com a vasta extensão de ocupações irregulares no território. Aquelas que
atendem aos requisitos legais e são passíveis de regularização fundiária devem ser
regularizadas, mas as áreas que foram griladas precisam ser retomadas pelo poder público.

A concentração do desmatamento em áreas públicas federais não quer dizer, todavia, que os
estados têm pouco a fazer para proteger a floresta. Há grande extensão de florestas públicas
estaduais que ainda precisam ser destinadas para assegurar sua proteção. É imprescindível,
contudo, que os governos estaduais priorizem o combate ao desmatamento em áreas
privadas. A eles cabe a responsabilidade primeira de fiscalizar e aplicar as leis ambientais
nessas áreas, que concentraram 28% do desmatamento acumulado ao longo da última década
no bioma Amazônia.

O Código Florestal é o principal instrumento para garantir a proteção de florestas em imóveis
privados, sendo os estados os responsáveis por sua implementação. A União pode — e deve
— apoiá-los, como já fez antes. Exemplos dessa parceria incluem a criação e a gestão de um
sistema federal unificado de cadastros ambientais, assim como a elaboração de ferramentas e
a provisão de insumos para os estados.

O Código Florestal é o principal instrumento para garantir a proteção de florestas em imóveis
privados, sendo os estados os responsáveis por sua implementação. A União pode — e deve
— apoiá-los, como já fez antes.'

Clarissa Gandour e João Mourão, do Climate Policy Initiative/PUC-Rio

Além disso, a cooperação e a coordenação dos governos estaduais e federal serão essenciais
para avançar o ordenamento territorial da Amazônia. Ainda restam “vazios fundiários” no
bioma, territórios que não foram destinados e sequer arrecadados pelo poder público. Apesar
disso, há indícios de que metade desse território já foi ocupado. As áreas sem informações
fundiárias responderam por cerca de um quinto da perda florestal na última década, mas é
difícil atribuir responsabilidade e punir os responsáveis pelo desmatamento que ocorre nesses
vazios fundiários. Arrecadar e destinar ou regularizar essas áreas precisam ser prioridades dos
novos governos.

Os próximos quatro anos representam uma janela de oportunidade para frear o
desmatamento na Amazônia. Para aproveitá-la, é crucial que governos estaduais e federais
atuem de forma rápida, certeira e coordenada.

A priorização estratégica pode fazer com que o combate ao desmatamento apresente
resultados mais acentuados e rápidos. Isso sinalizaria — tanto para aqueles que lucram com a
derrubada da floresta quanto para o mundo — que o Brasil está novamente comprometido
com a proteção da Amazônia.


Os artigos de opinião são de responsabilidade do seu autor.

Sobre os autores

Doutora em Economia pela PUC-Rio e coordenadora de Avaliação de Política Pública para Conservação no Climate Policy Initiative/PUC-Rio. Sua pesquisa avalia efetividade e impacto de políticas públicas de proteção florestal.
E-mail: [email protected]

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Mestre em Economia pela PUC-RIo, João Mourão é analista do Climate Policy Initiative/PUC-Rio. Ele utiliza técnicas econométricas, informações georreferenciadas e dados administrativos para estudar as políticas de preservação da Floresta Amazônica.
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