Governo federal recém-eleito sinaliza compromisso com desmatamento zero e desenvolvimento sustentável na Amazônia. Participação na COP27 poderá dar ampla visibilidade a isso.

Alívio. Imagino ter sido esse o sentimento compartilhado por todos aqueles que se empenham para proteger a floresta Amazônica ao ser oficializado o resultado do segundo turno das eleições presidenciais.

Ainda que o caminho a percorrer para que o Brasil volte a afirmar que cuida desse seu precioso patrimônio natural vá ser árduo, as sinalizações iniciais são animadoras. Desmatamento zero — não menor, mas zero — na Amazônia foi citado logo no primeiro discurso do recém-eleito presidente. Pouco depois, o governo norueguês anunciou o desbloqueio das verbas para o Fundo Amazônia.

Há grande expectativa de que, novamente sob o comando do presidente Lula, o Brasil deixe de ser visto como um pária no cenário internacional e volte a ocupar uma posição de protagonismo, principalmente em fóruns relacionados à questão climática. A primeira oportunidade para transformar essa expectativa em realidade já está aqui.

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2022 (COP27), que teve início no domingo (6), é o principal encontro internacional sobre mudanças climáticas. Além de contar com a participação de representantes da sociedade civil, comunidade científica e mídia, o evento também reúne líderes e delegações oficiais de quase todas as nações. Seu objetivo é, de forma simplificada, coordenar esforços para limitar o aquecimento global e, assim, mitigar os efeitos adversos das mudanças climáticas.

A COP27 será a primeira viagem internacional feita por Lula após os resultados das urnas. É uma sinalização forte de que sua preocupação com a questão climática não foi mero recurso retórico. O fato de que o evento acontece durante o intenso período da transição — e que, mesmo assim, contará com a participação presencial de Lula — reforça que o tema é considerado prioritário para o novo governo.

O foco das discussões sobre o Brasil deve ser a Amazônia. Desde 2000, 52% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa foram provenientes do setor de mudanças no uso do solo e florestas. Os nove estados amazônicos sozinhos respondem por 81% das emissões nacionais desse setor no período. Zerar o desmatamento na Amazônia seria, portanto, essencialmente análogo a reduzir as emissões brasileiras pela metade… e isso seria uma bela conquista.

A boa notícia é que o Brasil sabe o que tem que fazer para combater o desmatamento. As principais inovações de política pública que contribuíram massivamente para reduzir a taxa de desmatamento na Amazônia brasileira em 84% entre 2004 e 2012 foram desenvolvidas e implementadas nos governos Lula anteriores, em grande parte fruto do empenho da então Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

Wilson Dias / Agência Brasil
Marina Silva, deputada federal e ex-ministra do Meio Ambiente

Aliás, é reconfortante ver Marina ao lado do presidente eleito — seu comprometimento com o tema, sua competência e sua garra serão essenciais para fazer frente aos desafios que a política pública terá que encarar.

“É reconfortante ver Marina ao lado do presidente eleito — seu comprometimento com o tema, sua competência e sua garra serão essenciais para fazer frente aos desafios.”

Clarissa Gandour, doutora em Economia pela PUC-Rio e coordenadora de Avaliação de Política Pública para Conservação no Climate Policy Initiative/PUC-Rio

O antigo protagonismo do Brasil em questões climáticas foi conquistado graças à sua ousadia e ao seu pioneirismo. Zerar o desmatamento na Amazônia é um passo crítico para recuperarmos nossa liderança no cenário climático.

Mas o país pode fazer ainda mais. Pode voltar a pautar a agenda global de inovação em política pública para desenvolvimento sustentável. Combater a degradação florestal (e não apenas o desmatamento) na Amazônia, monitorar sua vegetação secundária e promover o crescimento socioeconômico da região através do uso produtivo de áreas já abertas são frentes de ação importantes para tal. E isso sem nem considerar o que pode ser feito nos outros biomas brasileiros, que também sofrem com extenso e grave dano ambiental.

O momento ainda é de muita incerteza e especulação, inclusive sobre quem assumirá a posição de maestro das políticas públicas de desenvolvimento sustentável no país. Mas uma coisa é certa: após quatro duros anos, voltamos a ter esperança de que poderemos deixar de focar na contenção de danos para novamente buscar formas de avançar a proteção da nossa Amazônia.

“O momento ainda é de muita incerteza e especulação, inclusive sobre quem assumirá a posição de maestro das políticas públicas de desenvolvimento sustentável no país. Mas uma coisa é certa: após quatro duros anos, voltamos a ter esperança.”

Clarissa Gandour, doutora em Economia pela PUC-Rio e coordenadora de Avaliação de Política Pública para Conservação no Climate Policy Initiative/PUC-Rio

A COP27 representa uma oportunidade de convidar o mundo para essa troca de ideias e de mostrar que os ares mudaram por aqui. Há muito trabalho pela frente — e nós estamos ansiosos e prontos para trabalhar.


Os artigos de opinião são de responsabilidade do seu autor.


Mais sobre a COP27

Sobre o autor

Doutora em Economia pela PUC-Rio e coordenadora de Avaliação de Política Pública para Conservação no Climate Policy Initiative/PUC-Rio. Sua pesquisa avalia efetividade e impacto de políticas públicas de proteção florestal.
E-mail: [email protected]

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