No quarto texto da série ‘Quatro Planos para a Amazônia’, especialistas avaliam que o documento é um dos mais completos dentre os quatro candidatos mais bem avaliados. No entanto, há desconfiança em relação às alianças da peemedebista.

O programa de Simone Tebet (MDB) reúne propostas para combate aos crimes ambientais, desenvolvimento sustentável, alinhamento com as questões climáticas e desmatamento zero. Na análise dos quatro especialistas, é o programa que traz as propostas mais concretas e assertivas. 

Ilona Szabó, presidente do Instituto Igarapé, afirma que o programa da peemedebista “traz um diagnóstico preciso, bem como um conjunto de propostas de combate aos ilícitos, como de soluções de desenvolvimento sustentável”. Segundo ela, a equipe da candidata tenta deixar claro que a agenda de sustentabilidade precisa ser onipresente em todas as demais e não como algo à parte. 

O QUE DIZ O PLANO DE TEBET SOBRE COMBATE AOS CRIMES AMBIENTAIS:

“Vamos deter a devastação da Amazônia, recuperar áreas degradadas e assegurar a oferta de infraestruturas sociais e econômicas que garantam melhoria das condições de vida do seu povo. E enfrentar o crime organizado que patrocina a destruição.

“Recuperar os mecanismos de comando e controle, fortalecer órgãos de fiscalização, como o ICMBio e o Ibama. É preciso acabar com a falsa dicotomia que opõe meio ambiente e desenvolvimento.”

“Em sua imensa maioria, o setor produtivo brasileiro – e o agro em particular – já produz com sustentabilidade e responsabilidade. No entanto, em contrapartida, os que destroem, devastam e desmatam ilegalmente serão tratados com total rigor e tolerância zero pelo nosso governo.”

“É a única proposta que coloca a economia verde no centro de todas as políticas públicas. Neste sentido, menciona por exemplo a intenção de criar secretaria executiva, vinculada à Casa Civil, para coordenar e integrar políticas intersetoriais para a Amazônia, com objetivo de sustentabilidade ambiental, econômica e social. Tal medida é importante no sentido de replicar a priorização e o arranjo institucional exitoso do PPCDAm, elevando ainda mais sua institucionalidade por meio de uma secretaria para este fim”, aponta Szabó. 

O PPCDam (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia) implementado durante a gestão de Lula e desenhado em três eixos principais: ordenamento fundiário e territorial; monitoramento e controle ambiental; fomento às atividades produtivas sustentáveis. É dito por especialistas como uma das políticas mais exitosas para a redução da taxa de desmatamento: passou de 27 mil km² em 2004 —  maior da história do país — para 4,5 mil km² em 2012 — a mais baixa já contabilizada até hoje.

Além de citar sem “medo” medidas, como o PPCDam, que foram marcas de governos que concorrem com ela nas eleições deste ano, Tebet promete fazer um “pente-fino” nas mudanças aplicadas pelo atual governo que desmontaram a pauta ambiental. 

Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, diz que as “coisas estão muito claras e que o plano de governo dela [Simone Tebet] é muito bom, com coisas interessantíssimas”. No entanto, o especialista aponta certa desconfiança em relação à candidata: “Se ela implementaria isso? Duvido. O compromisso dela agora é com os ruralistas”, disse. 

“O plano de governo dela é muito bom, com coisas interessantíssimas. (…) Se ela implementaria isso? Duvido. O compromisso dela agora é com os ruralistas”.

Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima

Tebet também defende em seu programa de governo a recuperação de áreas degradadas. Na visão de Astrini, é uma medida ambiciosa, já que está conectada com a detenção da devastação da Amazônia. No entanto, o especialista sentiu falta de qual seria o uso e a destinação dessas áreas após a recuperação. 

“É muito ambicioso isso daqui. É um sonho, na verdade. Diria que deter a devastação da Amazônia é acabar com o desmatamento. Recuperar área degradada para que? É recuperar para virar floresta de novo? Ou é para jogar na mão do setor produtivo, da agropecuária?”, afirma. “Mas soa bem”, complementa. 

Adriana Ramos, do ISA, avalia o plano de Simone Tebet como “equilibrado”. No entanto, diz que historicamente a candidata também levanta certa desconfiança por ter tido “posições que são bem contrárias aos direitos indígenas, inclusive projetos de lei de autoria dela e posicionamentos”.

De acordo com o projeto “Congresso em Foco”, Tebet votou 85% a favor das medidas propostas pelo governo Bolsonaro enquanto senadora. Além disso, de acordo com o relatório “Congresso anti-indígena”, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a candidata está entre os parlamentares que mais receberam doações de empresas ligadas ao setor do agronegócio.

“Então, eu acho que o plano de governo dela demonstra que ela está bem assessorada, que eles reconheceram e entenderam a importância da temática, da agenda política do momento, mas não significa dizer que a implementação disso teria uma coerência e uma construção por trás”, analisa Ramos. 

“O plano de governo dela demonstra que ela está bem assessorada, que eles reconheceram e entenderam a importância da temática, da agenda política do momento, mas não significa dizer que a implementação disso teria uma coerência e uma construção por trás”.

Adriana Ramos, coordenadora do Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA)

Beto Veríssimo, do Imazon, concorda que o plano é o mais completo e apresenta vários guarda-chuvas. O especialista diz que é a favor do uso do termo “desmatamento zero” nos programas de governo  – que também foi usado pelos outros candidatos – como medida para guiar um plano de governo, mesmo que ainda com números bastante distantes do zero. 

“Quando o Brasil lançou o programa Fome Zero seria difícil lançar um programa chamado Fome 90%. É claro que o desmatamento zero é uma coisa muito ambiciosa, não quer dizer que vamos um dia chegar a realmente zero, mas precisa ser bem residual”, explica. 

“Eu acho que está correto, mesmo que distante, que seja difícil, mas a redução do desmatamento é factível”, finaliza. 


Leia também a análise dos planos de Lula, Jair Bolsonaro e Ciro Gomes:


METODOLOGIA

O PlenaMata leu os quatro planos de governo dos quatro primeiros candidatos à Presidência melhor colocados nas pesquisas DataFolha e Ipec. São eles: Lula (PT), Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB).

Em sequência, separou os trechos relacionados à Amazônia, principalmente, mas também conectados à pauta ambiental, às mudanças climáticas e ao desenvolvimento sustentável.

Por último, os trechos foram compartilhados com os especialistas para análise das propostas. Adriana Ramos, Ilona Szabó, Marcio Astrini e Beto Veríssimo enviaram documentos em texto e/ou conversaram por telefone.


Esta análise é uma parceria do PlenaMata com a iniciativa “Uma Concertação pela Amazônia”, rede com mais de 400 lideranças engajadas na preservação da floresta. Veja, abaixo, a biografia dos analistas:

  • Adriana Ramos atua no campo das políticas públicas socioambientais há mais de 27 anos. Coordena o Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA). Faz parte da Coordenação do Observatório do Clima. Foi representante da sociedade civil no Comitê do Fundo Amazônia.
  • Beto Veríssimo é engenheiro agrônomo pela Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), pós-graduado em Ecologia pela Universidade Estadual da Pensilvânia (EUA), pesquisador sênior e co-fundador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e diretor do Centro de Empreendedorismo da Amazônia (CEA).
  • Ilona Szabó é cofundadora e presidente do Instituto Igarapé, um think and do tank focado nas áreas da segurança pública, digital e climática. É membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), onde coordena o eixo sobre governança climática. Empreendedora cívica, com formação em relações internacionais, desenvolvimento e políticas públicas.
  • Marcio Astrini é secretário-executivo do Observatório do Clima, rede formada por 77 organizações da sociedade civil brasileira que há 20 anos atua na agenda socioambiental e de clima. É ambientalista com formação em gestão pública, direito constitucional e políticas públicas.