A proteção da floresta precisa ir além do combate ao desmatamento. É essencial compreender, reportar e combater a degradação florestal na Amazônia.
Quase 20% da Floresta Amazônica já foi desmatada. Então, os 80% que restam — mais de 3,3 milhões de quilômetros quadrados de floresta tropical — estão intactos, certo? Errado.
Quando falamos sobre desmatamento na Amazônia, nos referimos ao “desmatamento em corte raso”, ou seja, à completa destruição da vegetação nativa que existia em determinada área. É um fenômeno que já conhecemos bem e sobre o qual já acumulamos décadas de monitoramento, análise e atuação de política pública.
O desmatamento não é, contudo, a única ameaça à floresta. Uma parcela da vegetação que ainda não foi desmatada está em processo de degradação florestal. São áreas que já perderam parte da sua cobertura vegetal, mas não o suficiente para serem consideradas desmatadas.
A perda de vegetação pode ser parcial, mas o dano que causa é enorme. Por ser menos resiliente do que uma floresta intacta, a degradada fica mais sujeita a sofrer danos que agravam seu estado de deterioração e, portanto, aumentam sua vulnerabilidade. A degradação florestal mina a capacidade de a floresta prover serviços ecossistêmicos críticos, como conservar biodiversidade e absorver e estocar carbono.
O tema é urgente para o Brasil. Em média, a degradação florestal na Amazônia Brasileira anualmente afeta uma área pelo menos tão extensa quanto — e, com frequência, maior do que — o desmatamento. As implicações para perda de carbono e, consequentemente, emissões de gases de efeito estufa são graves. Entre 2010 e 2019, estima-se que a degradação florestal tenha representado três quartos da perda bruta de biomassa na região e o desmatamento, apenas um quarto.
A degradação não é apenas o estágio inicial de um processo que culmina no desmatamento, mas um fenômeno com dinâmica e determinantes próprios. Os principais processos que impulsionam a degradação na Amazônia são: a extração seletiva de madeira, que interfere diretamente no ecossistema florestal ao remover espécies nativas; o fogo, que não ocorre naturalmente em ecossistemas tropicais; e o próprio desmatamento, que afeta condições climáticas em escalas local e regional.
Precisamos dedicar esforços para compreender e combater a degradação florestal. Ainda que seja sabidamente desafiador monitorar e mensurar um fenômeno tão diverso e complexo, já demos passos importantes nessa direção. O sistema oficial para monitoramento da perda florestal na Amazônia identifica diferentes tipos de degradação e há dados oficiais sobre a ocorrência de focos de calor em toda a extensão da floresta.
Apesar disso, o Brasil segue deixando a degradação florestal em segundo plano. As métricas de desempenho ambiental do país essencialmente ignoram a floresta degradada, olhando apenas para o desmatamento. Isso vale inclusive para as emissões associadas à degradação, que não são computadas nos inventários brasileiros de emissões de gases de efeito estufa. Acordos, compromissos e metas de redução de emissões que desconsiderem a degradação florestal serão insuficientes para mitigar o risco de cenários críticos de mudanças climáticas.
No passado, o Brasil conquistou enorme prestígio internacional devido ao seu pioneirismo para não apenas mensurar e monitorar o desmatamento tropical, mas também para combatê-lo. Agora, poderia novamente ocupar uma posição de liderança global ao compreender, reportar e enfrentar a degradação florestal na Amazônia.
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