Os estados da Amazônia avançaram na implementação da lei florestal, mas ainda restam importantes desafios a enfrentar.

O Código Florestal é hoje a principal ferramenta de política pública para a conservação florestal em áreas privadas no Brasil. Além de estabelecer diretrizes para a conservação e a restauração da vegetação nativa em imóveis rurais, o código define regras que limitam a expansão da área para produção nesses imóveis e, assim, cria incentivos para que produtores rurais invistam em práticas que promovam ganhos de produtividade. 

Ao garantir que a produção agropecuária brasileira esteja em conformidade com uma legislação ambiental criteriosa, o cumprimento do Código Florestal ainda contribui para a abertura de novos mercados para o produto nacional. 

No entanto, às vésperas dos dez anos da promulgação do código, sua implementação ainda constitui um desafio importante. Ele é uma lei federal que deve ser implementada em âmbito estadual. O protagonismo dos estados na regulamentação e operacionalização das suas regras e seus instrumentos é, portanto, fundamental para o seu sucesso. Em estudo recente, pesquisadoras do Climate Policy Initiative/PUC-Rio fazem uma radiografia da implementação do Código Florestal no Brasil. O resultado dessa análise mostra que existem progressos significativos acontecendo nos estados, principalmente na região amazônica.

A regularização ambiental das propriedades inclui etapas de inscrição, análise e validação do Cadastro Ambiental Rural, bem como regulamentação e implementação do Programa de Regularização Ambiental (PRA). O estudo identifica que os estados mais avançados na implementação da lei florestal encontram-se todos no bioma Amazônia (Figura 1). São eles: Acre, Mato Grosso, Pará e Rondônia. 

Figura 1: Status da implementação do CAR e do PRA pelos estados, 2021

Fonte: CPI/PUC-Rio, 2021

Em números absolutos, Mato Grosso lidera com 51 mil cadastros com análise iniciada, 6.158 cadastros validados e 454 termos de compromisso firmados para regularização ambiental dos imóveis rurais. Contudo, Acre e Pará são os estados com a melhor performance em 2021. 

O Acre aumentou em 48% o número de inscrições no CAR, triplicou o número de técnicos dedicados à análise dos cadastros e aumentou em 61% o de termos de compromisso assinados. O Pará, por sua vez, ampliou em 272% o número de cadastros analisados, em 60% o de cadastros validados e em 88% o de termos de compromisso assinados. Apesar de o Pará ser o terceiro estado em número de termos de compromisso, a área a ser restaurada em Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL) é três vezes maior que a área no Mato Grosso, estado com mais termos de compromisso assinados.

Rondônia teve um aumento da equipe técnica dedicada exclusivamente para análise e validação do CAR que rendeu bons frutos. Hoje, o estado consegue analisar 1.700 cadastros por mês, taxa que vem crescendo com o tempo. No entanto, Rondônia atualmente enfrenta um problema comum em diversos estados: ter que analisar um mesmo cadastro, em média, 14 vezes, até que o mesmo possa ser validado sem inconsistências. Isso tem dificultado bastante a conclusão da análise. O Maranhão também conseguiu ter um avanço significativo em 2021 na análise e validação dos cadastros, tendo aumentado em 700% o número de cadastros validados. 

É fundamental que nenhuma alteração ao Código Florestal seja proposta sem uma análise muito criteriosa dos impactos que tais mudanças possam vir a causar na implementação da lei nos estados.

Uma novidade importante desse ano foi a implantação, ainda que de forma incipiente, da análise dinamizada no Amapá e Amazonas. Essa ferramenta, desenvolvida pelo Serviço Florestal Brasileiro, permite que o sistema efetue correções automáticas nos cadastros e proponha retificações. Ela ajudou o Amapá a avançar da etapa de inscrição para a etapa de análise e validação do CAR. Cerca de 2 mil cadastros já passaram pela ferramenta, o que representa 25% dos cadastros do estado do Amapá, dos quais cerca de 1.800 tiveram informações corrigidas automaticamente pelo sistema e aguardam a concordância do proprietário.

Roraima, por outro lado, está ficando para trás no processo de implementação do Código Florestal. Roraima faz parte de um grupo de estados que não possuem legislação, não avançam na etapa de análise, não possuem bases cartográficas para implementação da análise dinamizada e não estão contemplados em acordos de cooperação técnica e financeira. É necessário direcionar esforços e recursos disponíveis para ajudar esse grupo.

O Código Florestal pode ter um papel central de indutor de crescimento verde, principalmente em um cenário pós-pandemia de recuperação econômica, atraindo recursos financeiros alinhados à conservação e à restauração florestal. Para isso, é necessário enfrentar os desafios para acelerar o processo de análise e validação dos cadastros, que ainda representa um dos principais gargalos para a implementação da lei, e chegar à etapa final de regularização ambiental dos imóveis rurais para a regularização dos passivos em APP e Reserva Legal.

Finalmente, as propostas de alteração ao Código Florestal que vêm sendo apresentadas no Congresso Nacional não arrefeceram em 2021. É o caso do PL nº 36/2021 que propõe novos prazos de inscrição ao CAR para manter o direito de adesão ao PRA. É fundamental que nenhuma alteração ao Código Florestal seja proposta sem uma análise muito criteriosa dos impactos que tais mudanças possam vir a causar na implementação da lei nos estados. Qualquer alteração legislativa que acarrete revisão significativa das regras estaduais, implicaria ignorar todo o empenho e os recursos que vêm sendo aplicados pelos estados para regulamentar e implementar essas normas, além de retardar a implementação do código e a regularização dos passivos ambientais nos imóveis rurais.


Os artigos de opinião são de responsabilidade do seu autor.

Sobre os autores

Doutora em Economia pela PUC-Rio e coordenadora de Avaliação de Política Pública para Conservação no Climate Policy Initiative/PUC-Rio. Sua pesquisa avalia efetividade e impacto de políticas públicas de proteção florestal.
E-mail: [email protected]

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Diretora associada do escritório do Climate Policy Initiative (CPI) no Rio de Janeiro. Lidera o Programa de Direito e Governança do Clima, no qual coordena um time de advogados e economistas, além de contribuir para projetos estratégicos transversais na organização. Colabora com o CPI desde 2012, ajudando os tomadores de decisão a fortalecer as políticas e as instituições relevantes para questões climáticas, com ênfase em finanças, uso da terra, infraestrutura e energia limpa.

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