Agora, recursos são fundamentais para reerguer políticas de combate ao desmatamento. No longo prazo, eles deveriam ser usados para apoiar medidas inovadoras para a promoção do desenvolvimento sustentável.
Emissões de gases de efeito estufa (GEE) são um ótimo exemplo daquilo que economistas chamam de externalidade. O termo é apenas “economês” para um conceito simples: um indivíduo gera uma externalidade quando uma ação sua afeta, positiva ou negativamente, terceiros que não estão envolvidos na ação. GEEs são essencialmente o combustível das mudanças climáticas: não respeitam fronteiras nacionais e se acumulam na atmosfera da Terra. Então, o que um país emite ou deixa de emitir afeta o resto do mundo. O cenário é de externalidade em escala literalmente global.
É razoável, “racional” diriam os economistas, portanto, que outras nações se importem com as emissões brasileiras. Aliás, não apenas se importem, mas estejam dispostas a pagar para que o Brasil reduza suas emissões. Afinal, elas também se beneficiam dessa redução. Aqui entram os mecanismos de transferências internacionais condicionais, que servem como uma forma de remunerar nações para reduzir emissões.
Um desses mecanismos é o Fundo Amazônia. De forma simplificada, ele funciona assim: o fundo recebe recursos doados por outros países (até hoje, Noruega e Alemanha) e destina esses recursos para projetos que se propõem a combater o desmatamento na Amazônia; se o desmatamento cai, os doadores liberam mais recursos para o fundo. Tudo regido por um conjunto de regras que foram acordadas entre as partes envolvidas, inclusive o Brasil.
O Fundo Amazônia não é um mecanismo de caridade nem filantropia — e tudo bem. O importante é que seu funcionamento seja transparente, sua estrutura de governança bem definida e representativa e seu aprimoramento ancorado em processos rigorosos de monitoramento e avaliação.
O mundo ainda está aprendendo a aperfeiçoar o desenho e o uso desses mecanismos de transferências internacionais, mas já ficou claro que eles podem ser potentes aliados no enfrentamento da crise climática. Foi muitíssimo bem-vinda, portanto, a recente retomada de repasses ao Fundo Amazônia por parte de seus antigos doadores. Há expectativa, ainda, de que o fundo receba aportes de novos doadores.
No curto prazo, o Fundo Amazônia deve desempenhar um papel central na reconstrução da política pública de combate ao desmatamento. Após o desmonte dos últimos anos, a situação é gravíssima e a prioridade precisa mesmo ser a reconstrução. A recomposição do orçamento do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima é condição necessária para isso, mas ela pode não ser suficiente para fazer frente às variadas, expressivas e legítimas carências na área. Os recursos do fundo podem ser usados para complementar o orçamento e, assim, ajudar a reerguer a estrutura de política pública para proteção florestal.
No médio e longo prazo, contudo, o Fundo Amazônia deveria atender a outro propósito. Recursos provenientes de doadores internacionais não podem ser a âncora daquilo que deveria ser uma política de Estado. Um governo verdadeiramente comprometido com o enfrentamento da crise climática precisa estar disposto a investir recursos — financeiros, de pessoal e de articulação política — nisso.
Se o Estado cumpre com o seu dever de assegurar um sólido arcabouço para implementação de políticas públicas de conservação, recursos como aqueles do Fundo Amazônia podem ser direcionados para apoiar esforços que estão na fronteira das ações para conservação e desenvolvimento sustentável. Isso inclui, sem dúvida, medidas inovadoras de política pública, mas também iniciativas da sociedade civil, do terceiro setor, da mídia e da academia.
Imaginem: políticas públicas robustas garantido o core da proteção florestal e bilhões em transferências internacionais disponíveis para impulsionar o conhecimento sobre como aprimorar ainda mais essa proteção. Essa seria uma combinação poderosa para a Amazônia.
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