O ‘mercado de carbono’ tem como objetivo comercializar emissões e absorções de carbono, mas enfrenta desafios em termos de eficácia e equidade. No Brasil, o projeto de lei PL 412/2022 busca regulamentar esse mercado, propondo a participação de comunidades locais e a criação de um Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), inspirado no modelo europeu.

Muito se fala do “mercado de carbono“, que é controverso devido à tentativa de mercantilizar um serviço ecossistêmico essencial, como as emissões e absorções de carbono. Por meio desse mercado, emissões que excedam ou fiquem abaixo de um certo limite poderiam ser comercializadas. É sempre importante lembrar que a atmosfera é única e compartilhada por todos os seres vivos do planeta. Portanto, aumentar as emissões em um local para compensar em outro local não resulta em nenhum ganho líquido que possa reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

O mercado de carbono nunca decolou efetivamente, mesmo em países desenvolvidos. Apesar disso, o governo brasileiro deve em breve regulamentar o mercado de carbono como uma ferramenta auxiliar nas estratégias de redução de emissões de gases de efeito estufa.

É sempre importante lembrar que a atmosfera é única e compartilhada por todos os seres vivos do planeta. Portanto, aumentar as emissões em um local para compensar em outro local não resulta em nenhum ganho líquido que possa reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

Paulo Artaxo

A proposta de um mercado de carbono surgiu com a criação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (UNFCCC, em inglês), durante a ECO92, no Rio de Janeiro. Em 1997, foi decidido que os países signatários deveriam assumir compromissos mais rigorosos para a redução das emissões de gases que contribuem para o efeito estufa, dando origem ao Protocolo de Quioto. O Protocolo entrou em vigor em novembro de 2004, quando 55% dos países, representando 55% das emissões globais de gases de efeito estufa, ratificaram o acordo. A partir desse momento, o objetivo central do Protocolo de Quioto passou a ser a limitação e redução das emissões de gases de efeito estufa, conferindo valor econômico à redução das emissões.

O chamado “Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL)” é um dos mecanismos de flexibilização de emissões criados pelo Protocolo de Quioto. Projetos que reduzem as emissões ou removem CO2 da atmosfera podem receber créditos de carbono que podem ser negociados em ambientes de mercado.

No caso das florestas, como a Amazônia, o chamado Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal  (REDD+) representa a categoria de atividades voltadas para a preservação de florestas ameaçadas pelo desmatamento causado pela ação humana. O sinal de ‘+’ indica que essa categoria se refere a atividades em países em desenvolvimento e abrange tanto o manejo sustentável da floresta quanto o aumento do estoque de carbono florestal. As atividades relacionadas ao REDD+ podem ser incorporadas em esquemas de mercados de carbono, permitindo a obtenção de créditos de carbono e a contabilização da redução das emissões de dióxido de carbono que resulta da prevenção do desmatamento.

A Comissão de Meio Ambiente do Congresso Nacional está atualmente discutindo o projeto de lei que visa regulamentar o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (PL 412/2022). Esse projeto apresenta desafios significativos, como a necessidade de quantificar a cadeia de valor dos créditos de carbono.

O texto do projeto prevê a participação de indígenas, quilombolas e comunidades extrativistas na geração e comercialização de créditos de carbono provenientes de projetos desenvolvidos em seus territórios, desde que haja cláusulas contratuais que garantam a indenização a essas comunidades em caso de danos.

As versões mais recentes do projeto propõem a criação de um Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), inspirado no mercado europeu. Esse novo modelo estabeleceria um limite (teto) para as emissões em setores como siderurgia, química, alumínio e fertilizantes. Dentro desse limite, as empresas receberiam Cotas Brasileiras de Emissões (CBE), que poderiam ser comercializadas para compensar as emissões daquelas que excedessem 25 mil toneladas de dióxido de carbono (CO2) por ano. Estima-se que entre 4 mil e 5 mil estabelecimentos se enquadrem nessa restrição.

No contexto das florestas, como a Amazônia, enfrentamos desafios significativos, que incluem a necessidade de monitorar e verificar o estoque de carbono, abordar o desmatamento evitado e considerar o sequestro natural de CO2 por meio da fotossíntese das florestas naturais. A legislação deve ser formulada para desencorajar práticas que possam manipular o sistema e para fortalecer os mecanismos de controle.

Além disso, é crucial garantir que a maior parte da receita gerada por esse mercado beneficie efetivamente as populações tradicionais da região. O Brasil assumiu compromissos no âmbito do Acordo de Paris, que incluem a meta de zerar o desmatamento na Amazônia até 2030 e reflorestar 12 milhões de hectares. Essas duas metas devem ser cumpridas independentemente da implementação das regulamentações do mercado de carbono.


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Sobre o autor

Paulo Artaxo é professor do Instituto de Física da USP, membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da World Academy of Sciences (TWAS), e é vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

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