Órgão quer abrir “conciliação” sobre exploração de petróleo na foz do Amazonas, quando legislação determina que decisão é técnica – e a cargo do IBAMA

Um dia após a decisão histórica dos eleitores do Equador de banir o petróleo no Parque Nacional Yasuní, na Floresta Amazônica, a Advocacia Geral da União (AGU) brasileira divulgou um parecer colocando mais lenha na fogueira dos defensores da exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas. O órgão avaliou que a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), estabelecida em 2012 por portaria interministerial das pastas de Minas e Energia e Meio Ambiente, não pode ser exigida pelo IBAMA no processo de licenciamento pedido pela Petrobras para perfurar um poço no bloco FZA-M-59, no litoral do Amapá.

O problema é que tal entendimento já havia sido dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o que torna o parecer da AGU inócuo. E mais do que isso, a AAAS não foi exigida pelo órgão ambiental quando negou a licença à estatal petroleira, e sim sugerida. A causa para não liberar a perfuração de um poço de exploração de petróleo na área deveu-se ao fato de a Petrobras não ter comprovado a segurança da operação. Em suma, a companhia não cumpriu as exigências relativas ao processo de licenciamento, e está recorrendo da decisão do IBAMA – como lhe garante a lei.

Mas as explicações técnicas não são suficientes para convencer uma parte do governo que defende explorar petróleo até a última gota, inclusive em uma região de alta sensibilidade ambiental como a foz do Amazonas. Um grupo que inclui os ministérios de Minas e Energia e da Casa Civil, a Petrobras, políticos aliados e, em última instância, até mesmo o presidente Lula.

Já que seu parecer não mudaria o cenário, a AGU também enviou um pedido de abertura de processo à Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal (CCAF) – coordenada pela própria entidade, explica a CNN. O objetivo é buscar uma resolução consensual entre os ministérios do Meio Ambiente e o de Minas e Energia, além de outros órgãos envolvidos. Se não houver acordo, porém, a decisão da CCAF – ao contrário do parecer da AGU – é de cumprimento obrigatório pela administração federal, seja ela qual for.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que vai pedir à Casa Civil que inaugure o mais rápido possível uma mesa de negociação com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e a direção da Petrobras. A ideia, segundo O Globo,é decidir como – e não mais se –  a petroleira poderá explorar petróleo na costa do Amapá. Se isso for adiante, como querem Silveira e outros, vai significar jogar a legislação ambiental no lixo, em prol da vontade política de seu grupo.

Especialista do Observatório do Clima e ex-presidente do IBAMA, Suely Araújo reforçou à Agência Pública que o órgão ambiental não recomendou a AAAS no licenciamento da foz do Amazonas por se tratar de um estudo obrigatório, mas porque é uma análise tecnicamente importante. E “porque sem ela não há elementos suficientes para decidir bloco a bloco”.

E diante da posição intransigente a favor da exploração de combustíveis fósseis numa área de tamanha sensibilidade ambiental, ela desabafa: “O pior é achar que o licenciamento ambiental é um espaço de conciliação de interesses ou de acordos políticos. O licenciamento tem de ser pautado por análises técnicas. Estão transformando essa arena, usando argumentos jurídicos para impor uma decisão política. Licenciamento ambiental não é arena para conciliação de interesses, para conciliação de brigas entre ministérios. É um processo de análise técnica do IBAMA, isso tem que ser respeitado. Não pode esvaziar o licenciamento e colocar decisões sobre licenças no âmbito de câmaras de conciliação da AGU. Não compete conciliar interesses. Imagina se a moda pega?”.


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