Comunidades indígenas e quilombolas da Amazônia estão sendo dominadas por facções que, além da exploração de mão de obra local e do tráfico internacional de drogas, fortalecem antigos crimes ambientais, como o garimpo ilegal

“Neo-pistolagem”. Este é o nome dado por um integrante da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) a um fenômeno cada vez mais forte no território amazônico. Comandado pelo crime organizado, ele se caracteriza pela invasão de Terras Indígenas e Quilombolas pelas facções, para se esconder, explorar a mão de obra, evitar fiscalizações, praticar crimes ambientais e dominar a rota do tráfico internacional de drogas. A recente tragédia humanitária na Terra Yanomami, em Roraima, é um exemplo desse movimento.

“As facções acabam assumindo um papel de ‘neo-pistolagem’ na região. Um papel tradicional de criminalidade, mas em uma nova versão nesse novo cenário rural florestal”, diz Pedro Diogo, da ABIN.

Investigações e pesquisas apontam que o movimento é puxado pelo Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, e pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo. Entretanto, conta também com outros grupos locais, associados às grandes facções, relata o g1.

“O traficante usa a logística e o conhecimento dos locais para facilitar os crimes. Ainda mais em casos de crimes de extração e mineração, que tem uma capilaridade muito grande”, diz Paulo Teixeira, do Ministério dos Povos Indígenas.

A dificuldade de monitorar o ambiente de fronteira facilita a expansão do crime organizado na Amazônia, aponta a ABIN. Soma-se a isso a precariedade das estruturas de segurança e de fiscalização; a expansão da produção de cocaína na Colômbia; e a entrada do skank colombiano no mercado brasileiro.

O novo cenário fez com que o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC, na sigla em inglês) incluísse um inédito capítulo sobre a criminalidade na Amazônia no Relatório Mundial sobre Drogas 2023, publicado na segunda (26/6). O documento reitera que o narcotráfico impulsiona os crimes ambientais na região, com ocupação irregular de terras, extração de madeira e garimpo ilegal.

Segundo o relatório, o Comando Vermelho vem estendendo suas operações de garimpo para a região de Madre de Deus, no Peru, que faz fronteira com o Brasil. Embora o CV tenha perdido força na fronteira brasileira com Paraguai e Bolívia, é tido como a facção brasileira de maior poder no Norte.

Enquanto isso, grupos como o PCC “se infiltraram em múltiplas operações de mineração ilegal, oferecendo ‘proteção’, extorquindo ‘impostos’ e controlando poços e máquinas de dragagem”, aponta o documento da UNODC, destacado pelo Estadão.

Pesquisador da Universidade do Estado do Pará (UEPA), Aiala Colares Couto afirma que essa é uma dinâmica recente, impulsionada pela fuga de integrantes do PCC do sistema prisional em Roraima. Isso deu origem ao “narcogarimpo”.

A sobreposição de crimes, explica Couto, passou a ser “regra básica dos grupos do narcotráfico”, que estabelecem alianças com outras redes criminosas ou passam a praticar outras modalidades de delitos ambientais. Tudo bastante facilitado pelo abandono da região amazônica no governo anterior. Afinal, não é segredo que na gestão Bolsonaro, órgãos de controle como o IBAMA foram praticamente extintos.

“Não podemos esquecer que essa relação se consolidou quando as fiscalizações por parte do governo federal ficaram enfraquecidas, o que, em grande medida, permitiu que as condições para a sobreposição de ilícitos fossem favoráveis”, reforça o pesquisador.


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