Jovens lideranças defendem que a COP28, que será em 2023, seja realizada na Amazônia para mostrar papel estratégico da floresta no combate às mudanças do clima.

“Se não levarmos a sério a mudança climática hoje, será tarde demais para nossos filhos o fazerem amanhã”. Quem disse isso não foi um cientista progressista, mas um político conservador, o ex-primeiro-ministro britânico Boris Johnson.

“Todos aqui falamos o que faremos em 2050 ou 2060, mas metade da população do mundo tem menos de 30 anos, enquanto a média de idade das pessoas presentes a este encontro é de mais de 60 anos”, lembrou o político, ainda, em seu discurso na abertura da COP26, em novembro de 2021, na Escócia.

Como se sabe, pouco se avançou naquela Cúpula do Clima, assim como a marcha lenta prosseguiu na deste ano, no Egito. É como se dissessem ao planeta: “Aguarde mais 72 horas”. A Terra é mãe, mas está esgotada; e nós, jovens, não queremos e nem podemos esperar até que seja tarde demais para fazer algo. Esse amanhã precisa ser hoje, ou pode não existir. A juventude deve entrar pra valer nessa briga, porque as consequências vão para a nossa conta. Não vamos cair nessa conversa de “na volta, mamãe compra”.

A Terra é mãe, mas está esgotada; e nós, jovens, não queremos e nem podemos esperar até que seja tarde demais para fazer algo. Esse amanhã precisa ser hoje, ou pode não existir.

Vamos ter cada vez menos gente com disposição e experiência para tocar a bola: enquanto nos anos 1960 a taxa de fertilidade global era de cinco filhos por mulher, hoje é de menos da metade; e a expectativa de vida era de 50 anos e hoje é de 73. A população brasileira está envelhecendo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2050 um em cada três de nós será idoso. Por isso, nos reunimos com jovens lideranças de todos os Estados da Amazônia Legal no fim de novembro, no II Encontro Nacional da Juventude Extrativista. Vivemos no olho do furacão climático e não seremos meros espectadores.

Não vamos fugir às nossas responsabilidades, como fazem algumas autoridades e empresários da velha guarda. O nosso futuro, o do Brasil e de toda a Humanidade é de nossa jurisdição. Por isso, devemos fazer parte dos processos decisórios. Não queremos somente dar ou não nosso aval, mas também colaborar e influir na construção de novas políticas públicas. Estivemos reunidos em Mazagão, no Amapá, com outras lideranças indígenas, extrativistas, ribeirinhas, sem-terra, quilombolas e demais povos da floresta para traçarmos uma estratégia em comum de inserção do jovem nos processos decisórios.

Não vamos fugir às nossas responsabilidades, como fazem algumas autoridades e empresários da velha guarda. O nosso futuro, o do Brasil e de toda a Humanidade é de nossa jurisdição. Por isso, devemos fazer parte dos processos decisórios.

Os povos originários, que estão aqui há mais tempo que os demais, têm a oferecer, além de seu conhecimento ancestral, a experiência de quem vem resistindo por mais de meio século e preservando o meio ambiente há milhares de anos; o Movimento dos Sem Terra (MST) criou técnicas de recuperação do solo; a educação quilombola é um modelo que poderia ser replicado país afora; e é graças aos pioneiros do extrativismo que hoje existem as reservas extrativistas, vitais para a conservação da floresta e a sobrevivência dos povos que dependem dela. Esses são alguns exemplos do que temos a dividir; numa só tacada, ajudamos o país a combater a fome, o desemprego e as mudanças climáticas. Mas também temos desafios comuns a todos os jovens brasileiros.

Nascemos junto com a internet e sabemos usá-la. Não há fake news que nos enrole e ela nos conecta com jovens do mundo inteiro, com quem trocamos vivências. Por outro lado, temos um ensino precário e poucos horizontes. A questão territorial é tão importante para nós, porque é existencial: somos moldados pela terra, não existimos sem ela. Infelizmente, muitos jovens saem de suas comunidades para estudar e não voltam mais. Queremos território, mas com acesso a emprego e educação, para que a juventude se fixe neles.

Defendemos que a próxima COP seja na Amazônia; queremos chamar a atenção do mundo para o nosso papel estratégico na defesa da floresta e a consequente importância dos serviços ambientais que prestamos. Também acreditamos que é preciso garantir recursos para a política de juventude em todos os programas nacionais e internacionais voltados para a região, como o Fundo Amazônia, e representatividade efetiva no próximo governo. Chegou a hora dessa gente renovada mostrar seu valor.


Os artigos de opinião são de responsabilidade do seu autor.

Sobre os autores

Extrativista, graduada em Etnodesenvolvimento pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e mestranda do Programa de Pós-graduação em Agriculturas Amazônicas e Desenvolvimento Sustentável (UFPA), Letícia Moraes, de 26 anos, é secretária de Articulação Política de Juventudes das Populações Extrativistas (CNS).

Nascida na Comunidade Extrativista Nossa Senhora da Boa Esperança, no Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Ilha São João I, no município de Curralinho, que fica na região do Marajó, no Pará, em 2021 ela recebeu o prêmio de jovem liderança nacional na Semana Chico Mendes, o principal encontro das populações extrativistas. Em 2018, já havia sido premiada pelo Governo do Acre, em reconhecimento pela luta em prol da continuidade do Legado de Chico Mendes.   

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Jovem liderança indígena, empreendedora e ativista, Marciely é do povo Tupari, de Rondônia, conhecido como ‘Guerreiros da Noite’. Atualmente coordenadora secretária da COIAB, integra a Associação de Proteção Etnoambiental (AGIR), que tem como objetivo dar visibilidade e promover o empoderamento das mulheres indígenas em Rondônia. Além disso, já atuou como coordenadora do Departamento da Mulher da Associação Indígena WÃYPA e Conselheira da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB), além de Conselheira Municipal dos Direitos da Mulher de Cacoal (CMDM). Marciely foi uma das representantes dos povos indígenas brasileiros na COP27, no Egito, onde participou de mesas e debates sobre racismo ambiental e cobrou participação efetiva dos povos tradicionais nas discussões e tomadas de decisão para o enfrentamento às mudanças climáticas. 

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Nascido na Comunidade Quilombola Saruê, Zona de Sequeiro de Santa Maria da Boa Vista, em Pernambuco, Caio Mota é um jovem ativista quilombola pelos Direitos Humanos e faz parte da Secretaria Nacional da Juventude da CONAQ e da Coordenação Estadual de Articulação das Comunidades Quilombolas de Pernambuco (CEAQUI-PE). Técnico em agropecuária formado pelo Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IFSertão-PE), é especialista em Tecnologias de Baixa Emissão de Carbono pela Universidade Federal do Vale de São Francisco (UNIVASF). Como aluno do IFSertão-PE, recebeu o prêmio de Láurea científica pelo projeto de pesquisa “Era uma vez o Quilombo Saruê: Narrativas Quilombolas como registro cultural de um povo”. 

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Nascido em Eldorado do Carajás, no Pará, Alan Leite da Silva tinha dois anos quando a cidade foi parar nas manchetes após o assassinato de 19 trabalhadores rurais por policiais militares, naquele que ficou conhecido como o Massacre de Eldorado dos Carajás. Hoje secretário do MTST no Pará, Alan cresceu no acampamento Dalcídio Jurandir, referência na produção de alimentos orgânicos, mas onde mais de 200 pessoas vivem sob ameaça de despejo do território, em disputa judicial desde 2008. Lá, ganhou destaque como uma das jovens lideranças do movimento, do qual participa ativamente desde os 15 anos e, nos últimos 11 anos, integra a Coordenação do Coletivo da Juventude. Graduado em Educação do Campo – Letras e Linguagens, atualmente mora em Marabá, no Pará, mas quer transformar a realidade das crianças e jovens do acampamento por meio do fortalecimento da educação do campo.  

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