Enfrentar o crime organizado e melhorar a qualidade de vida dos amazônidas pode se tornar um dos pilares da diplomacia brasileira no mundo

Na visão de Joseph S. Nye, professor de Harvard e conselheiro do ex-presidente Bill Clinton, existe um simbolismo único entre a invasão do Capitólio, em Washington, no dia 6 de janeiro de 2021, e a política assumidamente antiambiental imposta pelo presidente Jair Bolsonaro em seus quatros anos de governo. Ambos os episódios, diz ele nesta entrevista à BBC Brasil, serviram para enfraquecer o chamado soft power tanto dos Estados Unidos quanto do Brasil, respectivamente.

Por isso, defende o especialista, que levar a sério a Amazônia, o que parece ser o caso em relação ao novo governo que tomará posse em janeiro, principalmente depois do que ocorreu na COP27, no Egito, é também recolocar o Brasil no tabuleiro geopolítico mundial. “Eu diria que os Estados Unidos perderam muito soft power sob Trump por causa de sua abordagem agressiva de America First (“EUA primeiro”, um dos slogans do republicano e norte de sua gestão). E acho que o Brasil perdeu muito de seu soft power sob Bolsonaro. Mas os exemplos que mencionei sugerem que não há razão para o Brasil não conseguir recuperá-lo”, afirma Nye à repórter Mariana Sanches.

O termo soft power, cunhado pelo próprio entrevistado nos anos 1990, está relacionado com a atração que alguns países exercem não necessariamente pelo seu poderio militar ou econômico, mas por questões culturais. E pode ser o caso do Brasil, nas próximas décadas, em relação à questão ambiental.

O problema é que ninguém duvida que não será fácil recuperar o protagonismo ambiental. Porque, como mostram os projetos de lei recentes da União Europeia, por exemplo, que vão barrar a importação de produtos brasileiros atrelados ao desmatamento, apenas um discurso no caminho certo não resolve. É preciso agir, e muito.

A começar pelo combate ao desmatamento da Amazônia. Como mostra o texto analítico de Ana Carolina Amaral, o presidente eleito assume um índice de devastação da floresta altíssimo, apesar de uma pequena boa notícia ter sido registrada no último ano. “A herança para Lula, portanto, não será o alívio no dado de 2022, mas a destruição já contabilizada para 2023. Punir os desmatadores ilegais que hoje se despedem de Bolsonaro é uma das principais respostas que precisará ser dada pelo governo Lula”, afirma a jornalista na Folha.

Outra característica dos crimes em curso na Amazônia atualmente é que eles estão sendo praticados por quadrilhas muito bem engendradas que há anos atuam na região. Existem ramificações, também, em várias partes do país. Um dos exemplos mais recentes, como registra o Estadão, é a distribuição de mercúrio contrabandeado pelos garimpos ilegais da Amazônia. A suspeita da Polícia Federal é que o esquema só existe porque ele funciona a partir de fraudes feitas dentro do próprio sistema do IBAMA. O prejuízo aos cofres públicos pode ter chegado a R$ 1,1 bilhão. E a quadrilha já age há quase uma década.

Em paralelo ao combate ao desmatamento e as quadrilhas criminosas que atuam na Amazônia existe um outro conjunto de fatores que também precisa deslanchar segundo cientistas renomados que estudam a Amazônia há décadas. Em evento registrado pela Agência FAPESP, por exemplo, o cientista Carlos Joly voltou a ratificar que não existe desenvolvimento para a região se as pessoas da Amazônia não estiverem no centro do debate. “Não posso pensar só na conservação, mas também no bem-estar e na condição de vida daqueles que moram na região amazônica, que são quase 28 milhões de brasileiros, em torno de 35 milhões se pensarmos na bacia amazônica como um todo”, defende Joly, professor emérito da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), membro da coordenação do Programa BIOTA-FAPESP e organizador do evento.


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