Em jogo, um ponto de virada que pode ser salvador ou catastrófico

As eleições deste ano no Brasil representam um divisor de águas para o futuro da Amazônia. O avanço do desmatamento, com recordes atrás de recordes sendo quebrados nos últimos anos, está aproximando o bioma amazônico do chamado ponto de não retorno (também conhecido como ponto de inflexão). Trata-se de um momento a partir do qual o clima não conseguirá manter mais a floresta, por ser mais quente e caracterizado por uma estação seca mais longa, fazendo com que a maior floresta tropical do planeta seja substituída por um ecossistema muito degradado, “uma savana pobre”, como explica o pesquisador Carlos Nobre, membro da Royal Society, reconhecido internacionalmente por décadas de pesquisas sobre a Amazônia, em entrevista ao ClimaInfo. Se o desmatamento continuar avançando nos próximos quatro anos, os riscos tornam-se iminentes. Assim, dependendo do resultado do pleito presidencial, a preservação da floresta poderá tornar-se um tema prioritário, assim como a questão climática, ou continuar sendo malbaratada.

“Não é exagero dizer que o destino da Amazônia depende do resultado de nossa eleição em 2 de outubro. Se Bolsonaro ganhar mais um mandato, a maior floresta tropical do mundo pode passar de seu ponto de inflexão. Se ele perder, temos a chance de trazê-la – e o Brasil – de volta do precipício”, escreve Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental (ISA), no Climate Home News.

Para sustentar o argumento, a especialista em políticas públicas lembra que, sob o governo Bolsonaro, além do desmatamento amazônico ter crescido mais de 50%, a proteção aos indígenas também foi deixada de lado. “Desde que chegou ao poder, em janeiro de 2019, Bolsonaro liderou um ataque contra as agências governamentais e estruturas legais destinadas a proteger as florestas e os Direitos dos Povos Indígenas, arrastando o Brasil de volta aos dias de oeste selvagem que pensávamos ter deixado para trás há mais de duas décadas”, afirma Adriana.

A eventual vitória do ex-presidente Lula – líder das pesquisas a quatro dias das eleições – pode ter um efeito benéfico já no curto prazo, segundo os analistas, se for acompanhada de uma sinalização clara de que a Amazônia será prioridade, como foi quando a ex-ministra Marina Silva esteve à frente do Ministério do Meio Ambiente na primeira gestão de Lula.

Como escreve Jamil Chade, no UOL, “fontes envolvidas no plano de governo do petista indicam que a questão ambiental estará no centro da atenção, justamente nesse esforço de recuperar o espaço no mundo, amplamente afetado durante os quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL).” Segundo o jornalista radicado em Genebra, existem planos da candidatura petista de tentar restabelecer a credibilidade internacional do Brasil, desde o início do governo, também na questão climática.

Mesmo marcada para ocorrer oficialmente ainda dentro do governo Bolsonaro, a COP27, que será realizada em Sharm el-Sheik, no Egito, em novembro deste ano – logo depois das eleições –, poderá ser decisiva para marcar essa possível inflexão da política ambiental e climática do Brasil. Nesse sentido, caso Lula ganhe as eleições, a tendência é que existam ‘dois Brasis’ representados na Conferência do Clima do Egito, como mostra a matéria assinada por Sérgio Teixeira Jr. no Capital Reset. “Estou especulando, porque ainda não sabemos o resultado da eleição, mas todo mundo vai querer saber o que um novo governo brasileiro pensa, propõe, vai fazer diferente”, afirmou Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima, ao Capital Reset.

Outras fontes ouvidas pela reportagem dizem que, nestes casos, como ocorreu quando Donald Trump perdeu a presidência dos Estados Unidos, tanto emissores do novo governo quanto os próprios diplomatas do Itamaraty já podem ensaiar, mesmo que de forma extraoficial, os passos do próximo governo.

Fora da disputa presidencial, em alguns dos estados amazônicos, as pesquisas de opinião indicam um cenário diferente, onde o discurso propalado em Brasília desde que Bolsonaro tomou posse continua reverberando em alto e bom som. Como mostra o Amazônia Real, no Amazonas, por exemplo, “os três candidatos ao governo com mais chance de vitória não possuem um programa de proteção à floresta, aos Povos Tradicionais e Indígenas ou de combate ao desmatamento e crimes ambientais.”


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