A Amazônia Legal tem 1,5 vezes o tamanho da Índia e é maior que todo o resto do Brasil, mas muita gente ainda não entende bem os desafios da região.

A Amazônia ocupa um papel cada vez mais central no futuro do Brasil e do planeta. Ainda mais agora, com o crescimento da violência contra a floresta, contra seus habitantes e contra seus defensores. Nesse contexto, muita gente se pergunta: “O que eu posso fazer pela Amazônia?”

Para agir com efetividade, é importante conhecer alguns fatos aparentemente básicos, mas frequentemente mal compreendidos. Desde 2020, faço parte do projeto Amazônia 2030, uma iniciativa de pesquisa dedicada a buscar caminhos pragmáticos para o desenvolvimento sustentável da região. Graças a esse envolvimento, adquiri nova apreciação sobre a realidade amazônica.

Antes de mais nada, aprendi que a Amazônia Legal brasileira é muito maior do que parece. O território ocupa uma área de 8,5 milhões de km². Desse total, cerca de 5 milhões de km² correspondem à Amazônia Legal.

Isso significa que todos os estados não-amazônicos, começando pelo Rio Grande do Sul, passando por Minas Gerais e Goiás, e terminando no Piauí, cabem na Amazônia Legal. Ainda sobra espaço para encaixar todo o território de Portugal, Espanha, França e Alemanha. A Amazônia Legal brasileira equivale a 1,5 vezes o tamanho da Índia, simplesmente. 

Essa imensidão vem acompanhada de grande diversidade geográfica, econômica e cultural. Cada trecho do território e cada grupo social tem seus atributos, mas os grandes debates exigem um pouco de sistematização. 

Graças a um estudo desenvolvido por Brenda Brito e coautores, aprendi também que cerca de 45% das terras da Amazônia já foram designadas pelo governo como Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Terras Quilombolas. Outros 21% constituem propriedade privada e 8% abrigam assentamentos de reforma agrária. Parece bastante, mas sobram cerca de 25% sem informação fidedigna ou que ainda não foram destinados. É possível que parte desse território seja patrimônio particular não registrado em nenhuma base de dados governamental. No entanto, tudo indica que, em sua maioria, são áreas públicas, também conhecidas como terras devolutas.

O Brasil já possui uma série de leis e de regras que determinam a destinação dessas terras, mas disputas de interesse e morosidade burocrática conspiram para subverter a lei, manter a incerteza e prolongar a confusão. 

Christian Braga / Greenpeace
Focos de calor em área de Prodes (2017-2019) e Deter, no Município de Lábrea (AM).


A permanência de grandes áreas públicas não destinadas age como um ímã que atrai aventureiros e especuladores, incluindo gente interessada na exploração ilegal de madeira, extração indiscriminada de recursos naturais e grilagem de terras. No início, essas atividades criam uma ilusão de prosperidade. Após alguns anos, porém, os recursos naturais mais acessíveis se esgotam e a euforia dá lugar ao declínio, com índices socioeconômicos inferiores aos que existiam antes. 

Esse processo foi batizado por Beto Veríssimo e Danielle Celentano de “boom colapso” e ele já deixou em seu rastro mais de 70 milhões de hectares que foram desmatados e subsequentemente abandonados ou subutilizados. Essa área equivale aos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e metade de São Paulo. Em termos globais, é uma área um pouco maior que o estado americano do Texas.  

Estas terras representam um enorme desperdício, mas também uma grande oportunidade. Segundo Paulo Barreto, pesquisador do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), a maior parte das áreas desmatadas são ocupadas por pecuária extensiva com baixíssima produtividade.

De acordo com a pesquisa de Barreto, cada hectare de pasto na Amazônia abriga apenas um animal quando poderia facilmente abrigar três. Isso significa que o rebanho da região poderia ser criado em 1/3 da área enquanto os 46 milhões de hectares restantes ficariam disponíveis para outras atividades.

Para colocar esse número em perspectiva, essa área é grande o suficiente para abrigar toda a produção mundial de cacau, melância, mamão, manga, abacaxi, coco, pimenta do reino, banana e baunilha. Ainda sobram 4 milhões de hectares para manter toda a produção nacional de açaí e mandioca. 

O desafio, então, é inverter a lógica vigente: implantar medidas para o desmatamento zero de áreas novas, e aumentar a produtividade das áreas já desmatadas. Sem dúvida, os governos federais, estaduais e municipais cumprem um papel central nessa mudança de rumo.

No entanto, esperar pela ação pública não é suficiente. Todas as pessoas interessadas em um Brasil próspero e acolhedor podem usar esse conhecimento para encontrar sua própria forma de agir. 


Os artigos de opinião são de responsabilidade do seu autor.


Este texto faz parte de uma série de artigos com o tema “O que eu posso fazer pela Amazônia?”. Leia também o que dizem os outros colunistas do PlenaMata sobre o assunto:

Sobre o autor

Salo é professor da Universidade de Nova York (NYU), onde leciona disciplinas relacionadas à administração pública e desenvolvimento econômico. Formado em Administração Pública pela FGV, com mestrado em Direito e Diplomacia pela Fletcher School da Tufts University (EUA) e doutorado em Estudos Urbanos pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Desde março de 2020, é pesquisador associado do projeto Amazônia 2030.