Queimadas, pistas clandestinas e projetos de lei que tentam ampliar a mineração em Terras Indígenas sustentam um cenário tenebroso

Há anos, a invasão sorrateira dos garimpeiros ilegais em Terras Indígenas, principalmente entre os Yanomami, é um processo lento e silencioso para a maioria dos brasileiros. Os próprios líderes indígenas não se cansam de alertar que milhares de pessoas cometem crimes contra eles todos os dias dentro de suas fronteiras. Mas um levantamento de fôlego do New York Times, publicado nesta terça-feira (2/2), dá uma dimensão ainda mais nítida do tamanho do problema. E mostra, em detalhes, como os garimpeiros ilegais estão realmente com domínio da região. A rede de destruição inclui o uso de mais de 1,2 mil pistas de voo clandestinas, mostra o jornal americano.

Não bastasse o presente, o futuro das Terras Indígenas também é bastante incerto por causa de projetos de lei apoiados pela bancada bolsonarista que facilitam a instalação de projetos de mineração tanto em Terras Indígenas quanto em áreas protegidas em geral. Segundo um estudo recém divulgado, e abordado em reportagem da Folha de S.Paulo, a legalização da mineração em Terras Indígenas e outras Áreas Protegidas (APs) na floresta amazônica do Brasil levaria a novos desmatamentos de milhares de quilômetros quadrados.

A pesquisa modelou o que ocorreria em dez áreas do estado do Amapá e do Pará se todas fossem abertas ao garimpo, incluindo a RENCA (Reserva Nacional de Cobre e Associados), dois territórios indígenas e várias reservas naturais. De um lado, 242 jazidas minerais seriam abertas. De outro, haveria um desmatamento de uma área que equivale a cinco vezes a da cidade de São Paulo. Caso as áreas protegidas fossem mantidas, haveria um desmatamento menor, avaliam os pesquisadores.

“O artigo preconiza o tamanho do prejuízo e o que pode acontecer se o incentivo à mineração em Áreas Protegidas continuar sendo promovido por esse governo”, disse Ane Alencar, diretora de ciência do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), que não participou da pesquisa, à Folha, por meio da agência de notícias Reuters. A DW, também repercutiu o estudo.

As atuais atividades garimpeiras ilegais ou, talvez, mesmo as legais que possam ser ampliadas em um futuro próximo, não são os únicos problemas identificados na Amazônia hoje. Novos dados também divulgados nesta terça-feira pelo INPE mostram que as queimadas, quase sempre atreladas à grilagem de terras, permanecem em alta. A Amazônia registrou 5.373 focos de incêndio em julho, apontam dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (INPE). O número é um aumento de 8% em relação ao mesmo período do ano passado, quando 4.977 pontos de fogo foram detectados, segundo informa o g1. A única boa notícia é que o dado deste ano é 21% menor do que o registrado em julho de 2020, quando ocorreram 6.803 focos de calor. Sempre lembrando que a temporada de incêndios na Amazônia, normalmente, ocorre entre junho e outubro. O que indica que a situação ainda pode piorar este ano.

Todos estes problemas reais, identificados por órgãos de monitoramento e pesquisadores científicos que olham para frente, ficam ainda mais graves quando se considera o que vem ocorrendo em Brasília. Como registrou o site ((o))eco, a ex-presidente do IBAMA, Suely Araújo, disse, durante palestra na SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), que existe uma ação intencional do governo federal em dar as costas para as políticas ambientais relevantes.

“O Ministério do Meio Ambiente como administração direta, sem suas autarquias, está paralisado. A maior parte dos programas está sem andamento, e o pouco orçamento que tem, não é liquidado, não é executado (…) Mais de 90% [do orçamento] é ação orçamentária 2000. O que é isso? Ação orçamentária 2000 tem em todos os órgãos, é o que paga o cafezinho, a conta de luz, o aluguel, a segurança. É só isso que o Ministério, administração direta, gasta atualmente, só isso. Isso significa que é um órgão paralisado e isso é intencional”, avaliou Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima.


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