Especialistas dizem que governo federal tem “margem de manobra” para flexibilizar o que é desmatamento ilegal

A proposta de lei da União Europeia que impõe restrições à importação de commodities agrícolas associadas ao desmatamento tem sido muito criticada por associações do agronegócio brasileiro. A Aprosoja, associação dos produtores de soja do país, criticou a medida, classificando-a de “protecionismo comercial disfarçado de preocupação ambiental” e de “uma afronta à soberania nacional”. O Globo deu destaque à nota dos sojeiros.

O governo Bolsonaro foi na mesma linha. O chanceler Carlos França criticou as restrições comerciais propostas pela UE em sua política agrícola comum: “Na Europa, há muita agricultura subsidiada. Eu me pergunto: seria sustentável manter o uso ineficiente desses recursos de água e terra nesses países às custas de subsídios? Não seria isso antiecológico e antieficiente?”. O relato é do Valor.

Além da legislação proposta pela UE, os Estados Unidos e a China já assumiram compromissos públicos dizendo que não comprarão mais nenhum produto que tenha origem em áreas de desmatamento ilegal. Trazendo a discussão para o âmbito brasileiro, o que é mesmo desmatamento ilegal?

A revista Globo Rural resolveu conversar sobre a questão com vários especialistas no tema, sendo que alguns deles disseram que o Brasil realmente tem uma margem de manobra sobre o tema. Principalmente porque as definições do que é ilegal ou não é sempre feita no âmbito nacional, e nenhum país estrangeiro tende a interferir nisso.

“Com essa flexibilização do uso da terra no Brasil, com a atuação da bancada ruralista no Congresso, e com a mudança de presidências na Câmara e no Senado, tem sido feito um verdadeiro desmonte e se legalizado práticas que eram ilegais”, afirma Maureen Santos, professora de Relações Internacionais da PUC-Rio. A pesquisadora faz referência, por exemplo, aos Projetos de Lei 2.633/2020 e 510/2021, que tratam de regularização fundiária e da ocupação de terras públicas, e que têm avançado na agenda do legislativo  durante as presidências de Arthur Lira (PP-AL), na Câmara, e de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Senado.

O fato de existir um tratamento permissivo “em relação ao que é público e à privatização para benefício de alguns privados” também é um problema dentro desse tema, segundo Olympio Barbanti, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC. Segundo ele, o enredo segue uma lógica conhecida. A agropecuária começa em uma área que seria pública. Mas, sob a bandeira da geração de empregos e do desenvolvimento econômico de uma região, o governo federal transfere o direito de posse para o produtor. Nesse caso, será muito difícil, no exterior, a produção desta área legalizada ser definida como ilegal.

O que os especialistas avaliam, entretanto, é que o setor privado, frente a isso, terá um papel importante de arbitragem. Em todos os acordos internacionais fechados em Glasgow existe um peso importante de fundos de investimentos, que conseguem direcionar melhor os recursos para iniciativas que estejam realmente no caminho certo.


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