Plataforma reúne dados de cadeias produtivas da Floresta Amazônica, que pode agregar R$ 40 bilhões anuais ao PIB da região a partir de 13 produtos nativos
Com o objetivo de organizar dados de atividades ligadas à bioeconomia na região amazônica, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura e a iniciativa Uma Concertação pela Amazônia criaram uma plataforma que reúne informações sobre três das principais cadeias produtivas da floresta: açaí, cacau e babaçu. As culturas foram selecionadas para dar a partida no projeto por representarem o gradiente do extrativismo puro ao cultivo integrado.
A plataforma – batizada de “Painel da Floresta” – conta com apoio financeiro do Fundo JBS pela Amazônia e pretende integrar dados e metadados e apresentá-los de forma comparativa entre suas diferentes fontes. “Além disso, com o painel, buscamos propiciar uma visão muito mais completa do real tamanho da bioeconomia de base florestal no Brasil, para subsidiar e nortear o desenho de políticas públicas e investimento no setor”, explica Adriana Barros, do Grupo de Trabalho de Bioeconomia da Uma Concertação pela Amazônia, em entrevista a Um só planeta.
Os dados foram retirados das estatísticas produzidas durante 35 anos, entre 1986 e 2021, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A nova plataforma disponibiliza informações como a região das plantas, o valor da produção, a quantidade produzida em toneladas, área colhida e produtividade desses frutos, além de mostrar a evolução dos dados ao longo do tempo.
Embora ainda na fase de piloto, o painel já permitiu algumas descobertas, como a queda da produção de amêndoas de babaçu. Em 1942, eram produzidas 57 milhões de toneladas, com pico em 1979, quando o volume chegou a 251 milhões de toneladas. Desde então, a produção começou a cair, recuando para 119 milhões de toneladas em 2005 e baixando ainda mais, para 54 milhões de toneladas, em 2017.
Alcides Brum, membro do GT de Bioeconomia da Concertação e fundador da empresa Florestas Brasileiras, ressalta que a troca do babaçu pela soja e pelo óleo de palma fez os seus produtores e extratores perderem renda – o que levou ao êxodo rural –, e motivos para manter as florestas em pé. Segundo ele, pelo menos quatro empresas no Maranhão fecharam ou deixaram de operar com o óleo de babaçu.
“Outro fato marcante é o número de quebradeiras (grupos formados por mulheres de comunidades tradicionalmente extrativistas) do coco de babaçu. Na década de 1980 foram estimadas em 300 mil e hoje talvez não cheguem a 20 mil”, destaca Brum.
O exemplo do babaçu reforça a importância de estimular corretamente as cadeias produtivas tradicionais da Floresta Amazônica. Como mostra o estudo “Nova Economia da Amazônia – NEA”, liderado pelo WRI Brasil, a bioeconomia da floresta em pé é tradicionalmente invisível nas contas nacionais devido à informalidade e outras barreiras na região. Mas ela já representa um PIB de R$ 12 bilhões, muito maior do que mostram os indicadores atuais. E com investimentos adicionais, poderá atingir R$ 38,6 bilhões em 2050, com 833 mil novos empregos.
A NEA propõe o desenvolvimento da região com mitigação climática, incluindo desmatamento zero, restauração florestal e adequação da agropecuária e da matriz energética à produção de baixa emissão de carbono. “As próximas décadas serão decisivas para a região lidar com a transição para o baixo carbono, distanciar-se do ponto de degradação irreversível da floresta e reduzir as desigualdades”, destaca ao Valor a diretora executiva do WRI Brasil, Fernanda Boscaini.
Em artigo no Jota, Robert Taliercio e Marek Hanusch, do Banco Mundial, destacam a riqueza natural da região amazônica, mas reforçam que ela vem sendo destruída pelo desmatamento e práticas econômicas exploratórias. A essa devastação chamam de “tragédia dos comuns” – a falta de clareza sobre os direitos de propriedade em relação a um recurso, o que pode levar à superexploração, explicam.
“A tragédia da superexploração da Amazônia prejudica o Brasil e o mundo, já que o valor da floresta em pé – abrangendo serviços ecossistêmicos como a captura e o armazenamento de carbono, regulação do clima e uma biodiversidade excepcional – excede quaisquer valores privados gerados pela pecuária, extração de madeira ou mineração. No entanto, embora os benefícios ambientais sejam colhidos por um grupo difuso de beneficiários (no caso específico da Amazônia, praticamente o mundo todo), os lucros financeiros se dirigem a um grupo muito menor, que inclui, naturalmente, os próprios violadores das leis. Para eles, sem levar em conta os custos que impõem aos outros (as ‘externalidades negativas’, em jargão econômico), o cálculo econômico lamentavelmente trabalha a favor da destruição”, explicam.
Por isso, Taliercio e Hanusch destacam a necessidade de realinhar incentivos e torná-los compatíveis com uma governança florestal efetiva. Eles lembram o relatório publicado pelo Banco Mundial em maio, que argumenta que esse modelo de crescimento precisa ser reequilibrado entre a agricultura e os setores de manufatura e serviços, que impulsionam a transformação econômica. Isso, segundo eles, aumentaria a produtividade em toda a economia, e não apenas na agricultura.
“Isso removeria a pressão da fronteira agrícola e reduziria a resistência à proteção efetiva da floresta. E, quanto mais rápido mudarmos a expectativa de que o futuro da prosperidade na Amazônia está na agricultura extensiva, melhor. Para garantir que os incentivos mudem mais rapidamente, defendemos o uso de um modelo de financiamento para a conservação que monetize o valor excepcional das florestas da Amazônia, fazendo com que seja mais benéfico para todos protegê-las em vez de destruí-las”, sugerem.
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