Governo brasileiro opta por focar no gesto e não nos valores que os Estados Unidos devem aportar no Fundo Amazônia

Ao jornal O Globo, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que mais importante do que os valores que devem ser aportados no Fundo Amazônia pelos Estados Unidos é a disposição em si do país em aderir a um dos principais instrumentos existentes hoje ao alcance do Brasil para conservar a região.

“Isso tem um efeito catalisador, tem a importância dessa força gravitacional dessa chancela dos EUA que dá credibilidade e transparência para a pauta de proteção climática. Isso é uma mudança, num mundo que tem dois presidentes de grandes democracias tratando de temas que há 20 anos eram tabu”, disse Marina à repórter Talita Fernandes.

A questão climática foi um dos principais assuntos discutidos em Washington entre os presidentes Joe Biden e Lula. O encontro ocorreu na sexta-feira (10/1), na Casa Branca. Os Estados Unidos teriam anunciado a disposição de colocar US$ 50 milhões no Fundo Amazônia, valor que foi considerado decepcionante pelos negociadores brasileiros, conforme relata a reportagem da Folha.

A quantia exata, segundo Marina Silva, não entrou no comunicado oficial divulgado pelos dois países após a reunião bilateral porque ela ainda não está definida. A ministra fez parte da delegação brasileira que viajou ao Hemisfério Norte.

A expectativa agora, como relata Patrícia Campos Mello e Thiago Amâncio ainda na Folha, é que o governo dos EUA demonstre maior ambição na visita de John Kerry, enviado especial para o clima, ao Brasil. A viagem para Brasília deve ocorrer no fim do mês.

Do lado privado, a ida aos EUA também rendeu sinalizações positivas. Representantes do Bezos Earth Fund, do bilionário Jeff Bezos, e do International Conservation Fund of Canada, entre outros, se reuniram com representantes da delegação brasileira para demonstrarem interesse em investir na preservação ambiental.

Além da questão específica do Fundo Amazônia, a viagem do presidente Lula aos EUA, de um ponto de vista mais macro, serviu para consolidar como a questão ambiental terá um peso grande na política externa brasileira nesse novo governo.

A análise do jornalista Jamil Chade, do UOL, também vai nessa direção. Segundo ele, “em diferentes ministérios há uma conscientização de que será apenas com a redução do desmatamento que o país poderá recuperar a credibilidade internacional. Não por acaso, o foco do governo nestes primeiros meses será o de mostrar ao mundo que não há apenas uma mudança de tom e um abandono do negacionismo de Jair Bolsonaro. Mas também medidas reais e pragmáticas.”

Além das medidas internas, como a expulsão de garimpeiros de Terras Indígenas e de uma política proativa em relação aos Yanomami, existe uma agenda internacional sendo gestada. Em 2023, haverá um encontro que está sendo organizado pelos países amazônicos. Em 2024, o Brasil será sede de algumas reuniões do G20. E, em 2025, o governo Lula pretende levar a Conferência do Clima para Belém, no Pará.

A noção interna do governo quanto à baixa do desmatamento ser o único caminho a ser seguido está cada vez mais ancorada em estudos científicos. Como relata o Valor, uma pesquisa inédita sobre os desafios da transição energética brasileira, feita por várias equipes, é categórica: se até o final desta década o Brasil não conseguir eliminar o desmatamento ilegal, não há viabilidade técnica e realista para se zerar as emissões de gases de efeito estufa (GEE) até 2050, como prevê o compromisso nacional no Acordo de Paris.


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