Precisamos avaliar discursos e políticas governamentais com base no que realmente precisa ser feito diante da crise climática.
“Agora, vamos lutar pelo desmatamento zero da Amazônia.”. Essa frase estava no primeiro pronunciamento de Luiz Inácio Lula da Silva, após a confirmação de sua eleição para presidente. Tais palavras confortam os anseios de muitos, como eu, que trabalham pela conservação na Amazônia. Reforçam a expectativa de que o Brasil voltará a dar exemplo ao mundo sobre como agir para evitar o agravamento da crise climática. Além disso, essa frase automaticamente subiu a barra para avaliarmos planos e ações climáticas governamentais. Que fiquem no passado os tempos de se contentar com discursos de pouca ambição climática!
A crise climática não está apenas batendo à nossa porta. Ela está batendo na nossa cara! Em 2022, já tivemos pelo menos quatro grandes exemplos de eventos climáticos extremos no país: enchentes e tragédia na Bahia, em Petrópolis, em Recife e, mais recentemente, uma seca histórica no Amazonas. Houve mortes e prejuízos para milhares de famílias brasileiras. E tais situações não foram suficientes para que governos no país criassem programas de adaptação a tais eventos extremos.
As palavras iniciais do presidente eleito Lula sinalizaram que lidar com a crise climática está na agenda de seu próximo mandato. Mas não bastará aguardar que o governo federal reconstrua políticas ambientais que foram desfeitas pelo governo Bolsonaro. Também precisamos cobrar dos estados que alinhem suas políticas e incentivos para reduzir de forma mais expressiva e rápida as emissões de gases do efeito estufa no Brasil. Afinal, a gestão ambiental é compartilhada entre os diferentes níveis de governo.
Apesar das alianças de governos estaduais que surgiram nos últimos anos com o propósito de frear os desmandos das políticas anti-ambientais federais, não houve resultados expressivos. Na Amazônia, o desmatamento continuou subindo.
As alianças estaduais na agenda ambiental sem apoio do governo federal foram limitadas por pelo menos dois aspectos. Primeiro, a base política de muitos destes governos está próxima dos atores ligados a desmatamento, garimpo e outros crimes ambientais. Segundo, há fatores estruturais da governança ambiental no Brasil que limitam a capacidade prática dos estados no tema. Por exemplo, a competência na gestão ambiental é compartilhada entre União, estados e municípios, mas não há repasse de recursos para garantir essas funções de forma descentralizada.
Porém, a ausência de transferência de orçamento não justifica decisões políticas desses governos estaduais desalinhadas da conservação ambiental. Por exemplo, a sanção do governador de Rondônia à lei que reduziu quase 220 mil hectares de áreas protegidas estaduais, e que felizmente foi suspensa em novembro de 2021 pelo judiciário. Em outro caso recente, o governador de Roraima sancionou lei estadual que contraria a constituição federal ao proibir a destruição de maquinário usado em crimes ambientais. No Pará, um decreto estadual de 2020 poderá alocar um subsídio estadual de R$ 6,7 bilhões na eventual venda de terra pública, o que reforça um incentivo perverso à ocupação ilegal e especulação de terras públicas.
Considerando a gravidade da crise climática e a mudança no governo federal, precisamos subir coletivamente a barra de avaliação das políticas climáticas no Brasil. Os próximos quatro anos serão chaves para que o Brasil estabeleça políticas e ações com a ambição climática necessária segundo a ciência. E o desmatamento zero até 2030 precisa ser um grande objetivo coletivo a ser perseguido em todas as esferas de governo.
Para expandir o apoio a esse objetivo, talvez seja necessário encontrarmos “Janones climáticos” que possam levar a mensagem da urgência climática de forma mais atrativa a cada vez mais pessoas. Temos muitas lições sobre comunicação a aprender com o deputado federal André Janones, que combateu fake news e engajou milhões de pessoas nas redes sociais na campanha de Lula.
Afinal, o grau de consciência e exigência que tivermos agora em relação às políticas climáticas vai determinar o futuro que nossas crianças terão. Ou seja, se elas sofrerão com os cenários de maior aquecimento do planeta ou se conseguirão lidar de uma forma menos traumática com os efeitos climáticos já inevitáveis.