Enquanto os países desenvolvidos sinalizam com mais recursos para o financiamento climático, Brasil, Indonésia e Congo estudam uma aliança

Um dos grandes dilemas durante as grandiosas reuniões climáticas internacionais, como é o caso da COP27, em curso no Egito, é transformar discursos em ações práticas. Por isso, chama atenção, e de forma positiva pelo menos até aqui, o relato do jornal britânico The Guardian sobre as conversas entre representantes do Brasil, da Indonésia e do Congo. Os três países, juntos, abrigam 52% das florestas tropicais primárias do mundo. E, portanto, qualquer plano sério de combate às mudanças climáticas e preservação florestal passa por esse trio.

A aliança estratégica tem chance de vingar e até crescer, como informa a reportagem assinada por Patrick Greenfield. A Colômbia também tem intenção de propor a criação de um bloco de países amazônicos na COP27. Em termos práticos, se essas nações – onde estão a Amazônia, as florestas do Congo e de Borneo e Sumatra – realmente se acertarem ao redor de um bom plano de proteção florestal, mais recursos devem ser atraídos para a causa.

“Este acordo pode ser um promissor passo adiante se os Povos Indígenas e comunidades locais forem totalmente consultados nesse processo e seus direitos e liderança, respeitados”, observou Oscar Soria, da Avaaz, que comparou a aliança a uma “OPEP das Florestas Tropicais”, uma analogia ao cartel de produtores de petróleo que controla os preços internacionais do combustível.

No caso específico da Amazônia brasileira, o cientista Carlos Nobre, em entrevista ao O Globo, também está com os dois pés bem fincados no chão úmido da floresta. Segundo ele, a importância da eleição do ex-presidente Lula para mais um mandato presidencial tem importância tanto internacional quanto nacional, em termos de meio ambiente. Para o pesquisador, o desmatamento deve ser combatido desde o primeiro dia de governo.

“Com vontade política, o Brasil tem condições de reduzir drasticamente o desmatamento e, com isso, tornar-se o primeiro país entre os maiores emissores de CO2 do mundo [somos o quinto], a cumprir suas metas climáticas. Pode se tornar net zero [zerar as emissões líquidas de gases do efeito estufa] em 2040. Hoje, 50% das emissões brasileiras são provenientes do desmatamento”, disse Nobre na entrevista à jornalista Ana Lucia Azevedo. No Egito, o cientista brasileiro vai lançar junto com outros especialistas um projeto de restauração florestal para o sul da Amazônia, que deverá cobrir uma área de 1 milhão de hectares.

Da floresta para o ar condicionado. Enquanto cientistas e negociadores tentam obter caminhos práticos para a proteção florestal e do clima, nas salas da COP27, os grandes líderes continuam afirmando, em seus discursos oficiais, que colocar dinheiro na causa ambiental é o que deve ser feito. Rishi Sunak, o novo primeiro-ministro britânico, que chegou a ser criticado no Reino Unido por ter dito que não iria à COP, mas depois mudou de ideia, seguiu esse tom. Para ele, inclusive, como registrou o Valor, a crise energética resultante da guerra na Ucrânia não deve ser motivo de atraso, mas de aceleração do combate às emissões de gases de efeito estufa. 

Em sintonia com o colega do outro lado do Canal da Mancha, o líder francês Emmanuel Macron também disse que a guerra não deve ser motivo para que as nações sacrifiquem as metas climáticas. Macron reafirmou que a França segue firme com o seu objetivo de reduzir pela metade as emissões até 2030, por meio de investimento em energia limpa, como informa Ana Carolina Amaral na Folha.

O problema, novamente, é adequar totalmente o discurso à prática. Como mostrou um estudo divulgado pela Carbon Brief, os Estados Unidos e o Reino Unido desembolsam muitos bilhões de dólares a menos do que seria justo em financiamento climático. Segundo O Globo, as nações ricas se comprometeram em 2009, na COP15, a mobilizar a quantia anual de US$ 100 bilhões entre 2020 e 2025 para fins de adaptação às mudanças climáticas e mitigação das emissões nos países em desenvolvimento.

Pelo mais otimista dos cálculos, contudo, o mundo ficou cerca de US$ 17 bilhões abaixo do objetivo há dois anos e só deve cumprir a meta ano que vem. Levando em conta as fatias proporcionais e contribuições financeiras privadas, os EUA deviam ter pago US$ 39,9 bilhões em 2020, segundo os cálculos do Carbon Brief, em vez dos US$ 7,6 bilhões desembolsados. O Reino Unido, por sua vez, liberou 76% do que supostamente lhe caberia, ficando US$ 1,4 bilhão abaixo do ideal. Os números mostram como nem sempre é fácil efetivar, de fato, os acordos feitos no âmbito das reuniões da ONU.


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