Reserva que leva nome do ambientalista, símbolo da defesa da floresta e dos Povos Amazônicos e morto há 35 anos, é ameaçada por desmatamento e falta d’água

Em 22 de dezembro de 1988, Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, era assassinado em Xapuri, no Acre. Seringueiro, Chico se tornou símbolo global do extrativismo sustentável – e precursor do que hoje muitos chamam de “bioeconomia” – e da necessidade de preservar a Floresta Amazônica. Seu ativismo atraiu a ira de grileiros e fazendeiros da região, que o mataram.

Passados 35 anos de sua brutal morte, Chico Mendes volta a ser “assassinado”. Desta vez, na Reserva Extrativista (RESEX) que leva seu nome. A área vem sofrendo pressões políticas e econômicas e é afetada pelo desmatamento, pela crise hídrica e pela violência, direta ou simbólica. Ainda assim, resiste.

Os ataques à RESEX Chico Mendes são atestados por Raimundo Mendes de Barros, o “seu Raimundão”, de 78 anos. Ele é primo de Chico Mendes e seu ex-companheiro de luta, mostra o Terra. Na casa de “seu Raimundão”, retratos contam a história de luta e preservação da Floresta Amazônica entre os anos 1970 e 1980.

Nos anos 1970, quando começaram a chegar os primeiros fazendeiros na região, a RESEX era apenas uma área para seringueiros. As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) foram fundamentais para construir o pensamento de preservação da floresta em Chico e Raimundão.

“Começaram a agredir os seringueiros e a derrubar as florestas. Houve a criação de um sindicato entre os seringueiros e foi quando começaram os empates”, lembra o primo de Chico Mendes. O “empate” era uma técnica na qual os seringueiros reuniam toda a família para entrar na floresta e impedir que ela fosse derrubada.

Raimundão confirma o que todos os dados já mostraram: o desmatamento aumentou na RESEX nos últimos quatro anos, por incentivo do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. “Os fazendeiros se sentiram bastante protegidos e passaram a incentivar os seringueiros a derrubarem árvores.”

Também nessa época, a ex-deputada federal Mara Rocha (PSDB-AC) propôs um projeto de lei (6024/2019) para alterar os limites da reserva. O texto não avançou e, em dezembro de 2022, o PL, felizmente, foi rejeitado pela Câmara. Mas nunca se sabe se proposta similar não pode aparecer a qualquer momento.

Um fato inédito preocupa os moradores da RESEX: a crise hídrica. Seu Raimundão comenta que nunca havia faltado água, mas o desmatamento mudou essa realidade. A falta d’água prejudica também a extração do látex das seringueiras, principal atividade econômica dos moradores. O solo ressecado afeta a produção.

Mesmo com os problemas, Raimundão continua na luta pela preservação da Floresta Amazônica. Inclusive como fonte de sustento. “Quem diz que seringueiro vive na miséria está mentindo. Só se for na época em que tínhamos patrão. A floresta oferece muita fartura. Não deixaria por nada, é um amor que tenho pela floresta.”

Além de “seu Raimundão”, Ângela Mendes, filha de Chico, também atua na defesa da RESEX. Na época da morte de seu pai, ajudou a criar o Comitê Chico Mendes, lembra o Terra. Após algum tempo fora, Ângela voltou à instituição em 1992, e não saiu mais.

Desde 2016 o comitê desenvolve projetos como o “Conecta RESEX”. Seu objetivo é capacitar em comunicação digital os jovens moradores da Reserva Extrativista Chico Mendes, a fim de levar a comunicação da floresta para o mundo, explica o Terra.

Para os jovens que moram na reserva, o acesso à internet nem sempre foi algo possível. Mas, como o projeto inclui a oferta de infraestrutura digital, o aprimoramento educacional, até então dificultado pelo distanciamento físico da região, torna-se uma realidade cada vez mais comum.

“O acesso à internet está melhorando e dando oportunidade para os jovens continuarem os estudos. Logo mais, podem até fazer educação à distância. Eles não precisam mais sair da reserva para poderem garantir um ensino de qualidade”, celebra Wendel Araújo, de 28 anos, um dos participantes do “Conecta RESEX”.


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