ANATEL começa a instalar a fibra ótica na região, passo crucial para melhorar sua infraestrutura. Mas é preciso cuidado na implantação de projetos estruturantes

A precariedade da infraestrutura na Amazônia já é bastante conhecida. Assim como também é sabido que grandes obras instaladas na região serviram basicamente para beneficiar o restante do país, ignorando as necessidades da população amazônida, que arcou apenas com os ônus socioambientais. Assim, a inclusão socioeconômica amazônica passa necessariamente por suprir essa deficiência – e com uma visão local, e não do desenvolvimentismo do século passado, que marca o que já foi feito.

Um passo nesse sentido foi dado na terça-feira (1/8), quando a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e a Entidade Administradora de Faixa (EAF) iniciaram a implementação de três redes de fibra ótica do Programa Norte Conectado, que prevê a instalação de oito redes do tipo. O investimento, de R$ 1,5 bilhão, será financiado com recursos do leilão do 5G, realizado em novembro de 2021.

O “Norte Conectado” prevê instalar 12 mil km de fibra ótica nos leitos de rios da Bacia Amazônica – Negro, Solimões, Puruá, Madeira, Juruá e Branco. As infovias vão passar por 59 cidades onde vivem 10 milhões de pessoas, detalha a Época Negócios. Parte da capacidade será usada pelo setor público, e a outra, para empresas comerciais de internet, em troca da manutenção das redes.

A perspectiva é que todas as infovias fiquem prontas até 2025. Duas delas já foram implantadas. A infovia 00 – considerada o projeto-piloto – liga Macapá a Santarém e já está em funcionamento. A outra  (01), de Santarém a Manaus, foi concluída neste ano e espera apenas sua inauguração.

“Trata-se de um programa sem precedentes, que vai levar sinal de dados de alta velocidade para garantir à população melhorias em educação, saúde, pesquisa, defesa e Judiciário”, afirma o conselheiro da ANATEL, Moisés Moreira. “Estamos falando de uma região que está sendo degradada pela mineração ilegal e pelo desmatamento. A fibra representa uma oportunidade enorme de desenvolvimento econômico para a população”, complementa.

Entretanto, a degradação apontada por Moreira não está restrita às atividades ilegais listadas pelo conselheiro da ANATEL. A Amazônia é marcada por obras de grande porte que pouco beneficiam a população da região e deixam pesados passivos ambientais e sociais. Portanto, é preciso repensar os parâmetros que guiaram essas megaconstruções para que tais erros não sejam cometidos novamente.

“Investir em infraestrutura na Amazônia é uma necessidade urgente. A região enfrenta alguns dos piores indicadores sociais do país, como acesso precário a educação, internet, saneamento básico e saúde, além da escassez de oportunidades de emprego. Se planejadas com inteligência e sensibilidade, as obras representam uma grande oportunidade para desenvolver a região. No entanto, se feitas de forma precipitada, ouvindo interesses setoriais e sem uma visão ampla, podem causar danos irreversíveis ao meio ambiente, agravar os problemas sociais e desperdiçar recursos públicos”, sentencia Gustavo Nascimento, jornalista e coordenador de projetos em O Mundo que Queremos, no Um só planeta.

Por isso, Nascimento reforça que as abordagens desenvolvimentistas, que privilegiam grandes obras, não são a solução. Afinal, grande parte delas se mostrou cara, ineficiente e voltada mais para o público externo à Amazônia. Um dos exemplos mais gritantes disso é a hidrelétrica de Belo Monte.

“O custo final [de Belo Monte] foi de R$ 48 bilhões, três vezes mais que o previsto. Além disso, sua capacidade de geração de energia ficou abaixo das promessas, causou impactos ambientais significativos e não melhorou os indicadores sociais em Altamira e no seu entorno. Mesmo com a usina, mais de 4 milhões de pessoas têm acesso precário à energia elétrica na região.”

Compreender as diferenças regionais dentro da Amazônia é fundamental para pensar em obras que promovam desenvolvimento econômico sem causar destruição ambiental, ressalta o jornalista. Mencionando um estudo do projeto Amazônia 2030, que dividiu a região em cinco zonas – Amazônia Florestal, Amazônia Florestal sob Pressão, Amazônia Desmatada, Amazônia Não Florestal e Amazônia Urbana –, Nascimento destaca que cada zona tem particularidades com base na cobertura vegetal, o que permite estratégias específicas. E um desenvolvimento econômico que equilibre preservação e recuperação ambiental e inclusão social.

“O Brasil precisa adotar uma abordagem realista para desenvolver a Amazônia. Em vez de focar em uma única opção, como uma hidrelétrica, uma estrada ou ferrovia específica, é importante identificar as necessidades, como o transporte de carga ou a geração de energia, e comparar alternativas levando em conta custos, benefícios e impactos. Somente assim poderemos utilizar os recursos disponíveis e promover um desenvolvimento sustentável e equilibrado no Brasil, preservando a Amazônia para as gerações futuras”, finaliza.


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