Governo Federal e congressistas insistem em ações que podem turbinar a violência contra indígenas e minar a proteção aos biomas naturais

De um lado da Praça dos Três Poderes, em Brasília, congressistas estão articulando a aprovação de várias medidas que enfraquecem a proteção ambiental em plena semana do meio ambiente. O rolo compressor montado por Artur Lira na Câmara tem aprovado urgências desnecessárias e levado direto à votação no plenário projetos sem nenhuma discussão com a sociedade civil organizada ou com câmaras técnicas da casa. Ao mesmo tempo, Pacheco, presidente do Senado, desrespeitou o compromisso assumido por ele mesmo no dia do Ato pela Terra e encaminhou o PL dos Agrotóxicos somente para a comissão de agricultura. Já do lado do governo, reuniões ministeriais se tornaram evidências da vontade de aprovar medidas na surdina, as tais “boiadas”. A análise do portal o ((o))eco é oportuna ao esclarecer todos os retrocessos ambientais que podem ser aprovados em breve.

Nos próximos dias, por exemplo, o Código Florestal poderá ser alterado, para pior. O PL 1282/2019, prestes a entrar em pauta, propõe uma ampliação das hipóteses que autorizam a intervenção em Áreas de Preservação Permanente (APP), permitindo desmatar a vegetação em APP para a criação de reservatórios artificiais. Pela mudança, a recomposição da vegetação ciliar também não precisaria estar prevista no licenciamento destas estruturas.

O PL 2374/2020, por sua vez, amplia a data de anistia para desmatamentos em áreas de Reserva Legal, que passaria de 22 de julho de 2008 para 25 de maio de 2012. O Senado pretende aprovar este perdão aos desmatadores nos próximos dias. 

Na Câmara, o risco é que o PL 364/2019, que altera radicalmente o regime de proteção dos Campos de Altitude, entre em votação. Ele terá impactos diretos na Lei da Mata Atlântica e, indiretamente, reduzirá as salvaguardas ambientais do Código Florestal.

A preocupação é generalizada. Tanto que nove ex-ministros do Meio Ambiente resolveram se posicionar de forma conjunta, reporta a Folha de S.Paulo. Eles pedem que o clima eleitoral não favoreça a passagem de algumas “boiadas” pelas casas legislativas. “É fortemente recomendável que as deliberações ocorram com os consensos possíveis fora do clima eleitoral, considerando inclusive as perspectivas futuras de uma nova gestão mais bem alinhada com os compromissos ambientais e climáticos nacionais e internacionais do Brasil”, diz a carta assinada por Marina Silva, Carlos Minc, Edson Duarte, Gustavo Krause, Izabella Teixeira, José Carlos Carvalho, José Goldemberg, José Sarney Filho e Rubens Ricupero.

Enquanto isso, o desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips choca o mundo. O New York Times, como sua influência mundial, cita a omissão do governo brasileiro em fazer uma busca efetiva pelos dois. A dupla conhece muito bem a região do extremo oeste do Amazonas e, nos últimos dias, estava recebendo ameaças de morte. Ingredientes suficientes para que as autoridades brasileiras resolvessem agir de forma imediata. 

Sabendo das implicações diplomáticas que o caso tem, o Itamaraty já faz promessas públicas de “justiça”, como registrou o jornal O Globo. O fato é que a posição do governo federal em relação à região amazônica, desde os tempos da campanha de 2018, é de aumentar os conflitos socioambientais na floresta. 

O Vale do Javari e o município de Atalaia do Norte, onde Phillips e Pereira desapareceram, representam a síntese do que ocorre em toda a floresta amazônica. A violência contra os indígenas é cada vez maior, por causa, neste caso, do crime organizado, como mostra essa reportagem da Folha de S.Paulo. Tráfico de drogas, contrabando de madeira e garimpo – o mesmo que o governo Bolsonaro incentiva desde sempre na retórica e nas leis que quer aprovar no Congresso – caminham em paralelo em uma área 56 vezes maior do que o tamanho do município de São Paulo.  

“A gente vê o Exército e a Polícia Rodoviária Federal fortalecidos em alguns pontos, mas onde há degradação ambiental, na demarcação de Terras Indígenas, a gente não vê o mesmo empenho”, afirma à reportagem o procurador da República Ricardo Ardengui. Ele afirma que a ausência de Estado é um catalisador da atuação de facções criminosas maior “que o conceito de vazio demográfico da região”.


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