Financiamento dentro de critérios de sustentabilidade é urgente para barrar ilegalidade na Amazônia.
Vivenciamos a retomada da discussão da pauta verde, como têm sido chamados os sete processos relacionados a temas ambientais que voltarão a entrar em votação pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Antes de aprofundarmos no tema, só um pequeno passo atrás – as ações chegaram ao STF por intermédio de seis partidos políticos que impetraram medidas judiciais contra o governo federal, sob a acusação de que este está descumprindo regras criadas para combater crimes ambientais e proteger a Amazônia. Nesta quinta (28), na primeira audiência, a Corte derrubou três decretos, que excluíam a participação social em fundos, comitês e conselhos da floresta e o que permitia o autolicenciamento ambiental para projetos de médio porte.
Contra ou a favor, qualquer pessoa que acompanhe o noticiário – independentemente do veículo – está ciente do desmatamento desenfreado na Amazônia e nos outros biomas brasileiros. Não por sermos um país sem regras. Ao contrário, a legislação ambiental do país é bastante consistente, e o Código Florestal é um excelente exemplo disso. No entanto, assim como o Código não foi implementado ainda em sua totalidade, outras políticas também não estão sendo executadas e as medidas de fiscalização, de comando e controle foram totalmente enfraquecidas.
Há ações estratégicas que, se implementadas, poderiam conter rapidamente o desmatamento, como as seis ações sugeridas pela Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura, iniciativa que reúne mais de 300 organizações representantes do agronegócio, das entidades de defesa do meio ambiente, do setor financeiro e da academia em prol de uma agenda de futuro sustentável para o país.
A Coalizão apresentou, em ofício ao STF, subsídios técnicos e jurídicos para contribuir com o julgamento das ações, pois vê de forma positiva o engajamento dos três poderes no combate ao desmatamento e à mineração ilegal, entre outros ilícitos ambientais.
Entre as providências imediatas sugeridas pelo movimento ao STF está a ampliação da governança e regulação do Banco Central para financiamentos sob critérios socioambientais rigorosos. O raciocínio não tem nada de complexo: enquanto houver financiamento a atividades ilegais, como mineração em terra indígena ou qualquer tipo de garimpo ilegítimo, à agropecuária em área desmatada após 2008 (marco temporal do CF) e incentivo ou permissividade à grilagem de terra, elas continuarão acontecendo, não importa o quão escandaloso isso pareça aos olhos daqueles que sabem as consequências nefastas dessas práticas.
O crédito rural ou outra forma de financiamento, quando bem aplicado, tem a virtude de aumentar a produtividade no campo, o que naturalmente gera o efeito de reduzir a pressão de desmatamento sobre novas áreas.
No primeiro semestre de 2021, o Banco Central (BC) abriu consulta pública referente aos critérios de sustentabilidade aplicáveis na concessão de crédito rural e aos critérios que caracterizam empreendimentos que deveriam ter restrições de acesso ao financiamento.
Dessa forma, o BC estabeleceu sua política de concessão, exigindo para isso que a propriedade rural tenha inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR), que não esteja sobreposta a unidade de conservação ou terra indígena (a menos que o demandante seja habitante das comunidades locais) e tampouco que o proprietário esteja na lista de empregadores que mantiveram trabalhadores em condições análogas à escravidão, entre outras condições.
Com a publicação dessas normas em setembro, o que falta é sua implementação. O primeiro passo para isso seria a criação, já anunciada, de um bureau de crédito rural sustentável, prevista para ser concretizada em junho.
O bureau ficaria responsável por auxiliar os bancos na análise de risco socioambiental, uma exigência para a concessão de crédito. A definição de critérios sociais, ambientais e climáticos como condicionantes para a concessão do crédito agrícola é extremamente positiva e alinhada a tendências de administração de todo o mundo.
O que tem sido visto na prática, no entanto, é a escassez do senso de urgência. É preciso acelerar a implementação dessas medidas de forma imediata, antes que o dano seja irreversível. O que está sendo definido hoje será uma prática predominante no futuro, quando todo o modelo de produção, seja agrícola ou industrial, terá de ser inclusivo e ambientalmente sustentável.
Mas é necessário urgência, ou o Brasil continuará pagando o preço como pária internacional. Conhecimento, tecnologia, inovação e ciência nós já possuímos.
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