Desmatamento da floresta é responsável por quase 40% das emissões do Brasil, que aumentaram em 9,5% em 2020, segundo relatório do SEEG.

O SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa) coordenado pelo Observatório do Clima, lançou às vésperas da COP26 uma extensa análise da atual situação das emissões de gases de efeito estufa no Brasil. Foram contabilizados todos os principais setores econômicos e as emissões de CO2, CH4 e N2O. As notícias não são boas para o Brasil.

O Brasil aumentou em 9,5% suas emissões de gases de efeito estufa em 2020 comparada com 2019. É um enorme aumento, em um ano de pandemia e em um momento na qual os países têm que reduzir suas emissões em pelo menos 5% ao ano de acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, na sigla em inglês). Com o aumento expressivo das emissões e a queda de 4,1% no PIB, o Brasil ficou mais pobre e poluiu mais. É o maior nível de emissões desde 2006. Na COP26, Brasil mostra que está indo na direção contrária de nossas necessidades. 

A mudança de uso da terra lidera as emissões brasileiras, com 47% do total de emissões. Só o desmatamento nos nove estados da Amazônia Legal representou quase 40% desse percentual. As emissões relativas ao desflorestamento alcançaram 998 milhões de toneladas de CO2e em 2020, um grande aumento de 24% em relação a 2019. Foi a maior emissão dos últimos 11 anos.

O sistema PRODES do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (INPE) estima que foram desmatados 10.851 km² de florestas em 2020. Se a floresta amazônica fosse um país, seria o 9º maior emissor de gases de efeito estufa. O perfil de emissões brasileiras ainda é dominado por uma atividade majoritariamente ilegal e que não contribui com o PIB nem com na geração de empregos no país.

O segundo setor com maiores emissões é a agropecuária, que emitu 577 milhões de toneladas de CO2e (27% do total nacional) em 2020, com uma alta de 2,5%. Destaca-se o aumento das emissões de metano oriundo da fermentação entérica da pecuária: gado de corte e de leite corresponderam à 75% das emissões. Destaque para o potencial de redução de emissões das pastagens bem manejadas.

O setor de energia, que respondeu por 18% das emissões do país em 2020, teve uma expressiva redução de emissões, de 4,6%. Isso ocorreu devido à pandemia, que, nos primeiros meses de 2020, reduziu o transporte de passageiros, a produção da indústria e a geração de eletricidade. Com 394 milhões de toneladas de CO2e, o setor energético retornou aos patamares de emissão de 2011, o que é uma boa notícia para o país. Foi o que apresentou a maior queda percentual de emissões em 2020. Houve uma forte redução no setor de transportes, e a demanda por gasolina e etanol também diminuiu de maneira relevante.

No setor de resíduos sólidos, as medidas de quarentena aumentaram as emissões, principalmente pela disposição de lixo em aterros sanitários e lixões e de esgoto doméstico. O crescimento no setor foi de 1,8%, saindo de 90,4 milhões para 92 milhões de toneladas de CO2e. O aumento da urbanização no Brasil tem um papel importante nestas emissões.

Nas emissões industriais, representadas sobretudo pela fabricação de aço e cimento, atividades altamente poluidoras, permaneceram estáveis em suas emissões mesmo na pandemia. O setor emitiu 99,7 milhões de toneladas em 2020, representando somente 5% das emissões totais do Brasil.

Desde 2010, quando a Política Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC) foi regulamentada, o Brasil aumentou suas emissões líquidas em 28% — um aumento proporcionalmente maior que o das emissões brutas. Isso ocorre porque as emissões aumentaram mais rápido que as remoções.

Além das emissões, o SEEG estima também as remoções de gases de efeito estufa, para que seja possível calcular o balanço líquido. As florestas nativas brasileiras sequestraram 636 milhões de toneladas de CO2e (MtCO2), enquanto as emissões deste setor foram de 998 MtCO2e. Destaque para a absorção de CO2 em áreas protegidas na Amazônia e as emissões tardias associadas ao desmatamento e à degradação florestal.

Considerando as remoções, as emissões líquidas do Brasil foram de 1,52 GtCO2e, o que representou um aumento de 14% em relação a 2019. Desde 2010, quando a Política Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC) foi regulamentada, o Brasil aumentou suas emissões líquidas em 28% — um aumento proporcionalmente maior que o das emissões brutas. Isso ocorre porque as emissões aumentaram mais rápido que as remoções.

O relatório do SEEG mostra que o Brasil não está indo na direção do cumprimento de seus compromissos do Acordo de Paris e nem das metas da PNMC. Isso se deve principalmente ao aumento da taxa de desmatamento da Amazônia e às altas taxas de emissões do setor agropecuário. É fundamental que o país retome sua trajetória de redução de emissões e construa uma economia de baixo carbono em todos os setores fundamentais da economia brasileira.


O físico e professor da USP Paulo Artaxo, membro do IPCC, está escrevendo sobre a COP26 especialmente para o PlenaMata, direto de Glasgow. Os artigos de opinião são de responsabilidade do seu autor.

Sobre o autor

Paulo Artaxo é professor do Instituto de Física da USP, membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da World Academy of Sciences (TWAS), e é vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

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