Entre os culpados estão solo degradado, sem cobertura e com pouca matéria orgânica, além de pouca vegetação nativa

No último fim de semana, cidades do interior paulista foram engolidas por uma densa nuvem de poeira causada por rajadas de vento em alta velocidade que atingem o solo e levantam o pó. Além da estiagem e da pior crise hídrica dos últimos 90 anos pela qual passa o país, outros fatores ajudaram o fenômeno, pouco comum, a se formar na região, de acordo com especialistas ouvidos pela BBC. O principal deles é o solo degradado. A região afetada é produtora principalmente de cana-de-açúcar, e nesta época do ano, muitos agricultores deixam o solo nu, esperando o início das chuvas para começar a plantar.

Depois de dois anos consecutivos de pouca chuva, e igualmente afetados pela geada neste ano, muitos canaviais se tornaram improdutivos e foram derrubados. Sem cobertura e revirado por máquinas agrícolas para prepará-los para o plantio, o solo foi levantado com mais facilidade pelo vento. Além disso, o uso intenso de fertilizantes e pesticidas diminui a quantidade de matéria orgânica no solo, que ajuda a mantê-lo coeso. E não é só o vento que o carrega, causando erosões. As chuvas também. Por isso, muitos agricultores pelo mundo têm abandonado a técnica de revirar o solo, optando por práticas menos invasivas. Mas isso ainda não é muito praticado na região.

Imagens de satélite de alta resolução feitas na véspera mostram grande quantidade de terra nua nos arredores de Franca e, para o Coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Humberto Barbosa, não há dúvidas: “A impressão digital está lá; é muito clara a relação (da tempestade de poeira) com a degradação do solo”. Nos Estados Unidos, práticas agrícolas inadequadas ajudaram a causar o Dust Bowl, uma série de tempestades de areia que atingiram o sul do país nos anos 1930.

O reflorestamento das áreas mais sensíveis à erosão, como determinado pelo Código Florestal, mas pouco cumprido, também poderia ter ajudado a evitar o fenômeno. Há pouca vegetação nativa na área afetada, que tem um dos menores índices de cobertura florestal do país. De acordo com o Relatório de Qualidade Ambiental 2020, produzido pela Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo, na região de Ribeirão Preto somente 13,29% ainda é ocupada por ela. Em Franca, ocupa 10,83% do território e, em Barretos, somente 5,52%.


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